Apesar dos desprazeres

O prazer que uma viagem proporciona só é sentido por quem deixa seu torrão.

Areja as ideias. Da alma nova ao viajor. Acultura o pensador. E, principalmente, no meu caso, não tem como evitar as comparações.

Recém-chegado da América, a do Norte, bem dito, se bem que da Europa só trago boas recordações, não tive como me sentir a vontade naquelas plagas onde a língua inglesa predomina.

Já estive em Las Vegas em passant. Foi uma estada breve. Ainda me lembro daquele dia corrido, quando pelo estado de Nevada passei.

Ao adentrar em um cassino de olhos esbugalhados fiquei. Confesso que aquelas moedas de alguns cents perdidas não me fizeram falta. Foi em uma máquina caça níquel onde depositei algumas delas. E de bolso vazio voltei.

A viagem de agora, que na sexta finda terminou, foi mais longa, mais ilustradora de como nossos vizinhos do norte sabem como ninguém vender seu show.

Las Vegas impressiona ao primeiro passar de olhos. Como conseguiram edificar uma cidade como aquela num território tão inóspito. Trata-se de um deserto fincado no centro dos Estados Unidos. Onde pedras predominam, onde só chove uma vez ao ano, se tanto.

Eles criaram um oásis de um verdume ímpar num Saara verdadeiro.

Hospedamo-nos, minha esposa, meu filho e minha nora querida, que traz no seu ventre mais um netinho, o Gael, num grande hotel de propriedade do presidente norte- americano.

Trata-se de uma edificação portentosa. Ali não se pode jogar. Para nossa tranquilidade e de outros hóspedes. O Trump Internacional impressiona pelas suas torres de um amarelo ouro. Ficamos a beira do céu. Precisamente no quadragésimo nono andar.

Para se deslocar em Las Vegas deve-se usar as pernas. E como elas andam. Sob um calor de perto de trinta graus, sob um sol de rachar, mal se tem tempo de sentir calor. Dizem que no meio do ano o calor sobe a quase quarenta. E o secume do ar fica irrespirável.

A paisagem idílica impressiona aos viajantes. Cassinos, calçadões perfeitos, limpos e bem cuidados, tapetes de todas as cores e bordados, fontes dançarinas, luminosos que nos oferecem atrações imperdíveis, shows que vão e voltam, entre eles cito o circo de Soleil, David Coperfield, atraem visitantes do mundo inteiro.

Em nossos périplos andarilhos nunca vi um papelzinho jogado ao chão. A limpeza das ruas impressiona principalmente a nós brasileiros.

Bellagio, Winn Encore, Caesar, Mandalay Bay, Venetian, são cassinos obrigatórios para quem passa por Vegas. Pode-se, em nossa caminhada por Vegas, atravessar um ou outro, por passarelas intermináveis, através de cenários encantadores.

A jogatina é um vicio do qual não sou adepto. Mas quem vem a Vegas não se furta a este costume bem americano. Ou se enche os bolsos ou o deixa vazio. Mas o que são alguns dólares a mais ou a menos para estes endinheirados jogadores?

Durante a nossa viagem fomos conhecer mais uma maravilha do mundo moderno. O Grand Canyon, com suas voçorocas intermináveis, são um espetáculo a parte. Lá em baixo corre o rio Colorado com suas águas barrentas. A barragem Hoover impressionou-nos pela quantidade de concreto derramado. Foi um marco da engenharia, em se tratando da época em que foi construída.

Foram quase dez dias de viagem. Mais uma vez a América me encantou pela limpeza e cuidado de suas ruas. Pela educação e patriotismo do seu povo.

No entanto quem vai volta. E, uma vez de volta da São Paulo, mais um desencanto nos aguardava.

O aeroporto de Guarulhos não estava preparado para receber tantos voos. Desta vez o avião da Delta não tinha túnel para receber quem desembarcava. Tivemos o sobressalto de ir de ônibus. E a limpeza das instalações deixava muito a desejar.

E o centro de São Paulo? Nas proximidades da famosa Vinte e Cinco de Março?

Pasmem! Esgoto a céu aberto corria pelas ruas. Lixo, sujeira, entulho  de construções impediam o nosso andar seguro. O mau cheiro nos empestava as narinas. Drogados dormiam sonâmbulos a luz do dia.

Mesmo mercê de tantas coisa ruim me senti em casa. Afinal esta é a pátria minha.

O Brasil, com suas belezas mil, nos encanta e nos fascina.

Apesar dos desprazeres aqui me sinto a vontade. Mesmo que a sujeira predomina, que a falta de conforto nos faça ter vergonha de termos nascido em outro hemisfério, é aqui que desejo passar meus derradeiros dias.

Quem sabe um dia a coisa mude? Quem sabe? Tomara o prazer em viver aqui supere os desprazeres de ter voltado um dia. É o que desejo deixar aqui, depois desta visita breve. A este país que amo tanto. Mesmo com tanta coisa a ser mudada. Quem sabe um dia?

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