Quantos dezembros virão?

Hoje, sete de junho, minha mãe comemoraria mais um ano de vida. Isso se ela ainda vivesse.

No entanto ela ainda vive dentro de mim. Com aquele sorriso franco, com aquela benevolência toda, com aquele olhar bondoso.

Ainda me lembro do dia do seu passamento. Já comentei sobre este fato em textos passados. Mas, por se tratar de uma lembrança tão singela torno a repeti-lo.

Uma pessoa me ligou de sua casa. Estava de plantão num hospital. Ou no bloco cirúrgico. Enfiado a uma operação qualquer.

“Paulinho. Corra, sua mãe não está nada bem. Falta-lhe o ar. Imagino que seu pobre coração tenta bater e não consegue”.

Em menos de cinco minutos lá estava eu. Ofegante da mesma forma. Não por ter meu coração ainda jovem tiquetaqueando como o dela. Mas receoso do que iria encontrar. Ou o que poderia fazer para alongar um cadinho mais a vida da minha querida mãe.

Num carrinho azul, de um azul límpido como sua alma pura, levei-a ao mesmo hospital onde estivera antes. Ela entrou porta adentro amparada por mim. Tomamos o elevador. Fomos, orientados por um primo especialista em doenças circulatórias a entrarmos na sala de cirurgia. Foi tentado, como derradeiro recurso, o implante de um marca passo. Tentativas debaldes. Ela morreu em meus braços inoperantes em deter a morte.

Tudo isso aconteceu em dois mil e cinco. Faz treze anos que minha mãe nos deixou. Caso ela estivesse viva contaria com noventa e seis anos de existência profícua. Quase entrada na casa dos cem.

Agora conto, entre minhas lembranças, com sessenta e oito anos. Faço desaniversario em sete de dezembro perto. Não gostaria que esta data fosse tão perto assim.

Não tenho do que me queixar nestes anos todos de vida. Sou feliz. Ao lado de uma família maravilhosa. Uma esposa dedicada. Dois filhos emancipados. Um netinho lindo que me faz pensar no futuro. E dois outros a caminho.

Justamente por pensar em meus netos, Theo conta com quase dois aninhos, foi que pensei em quantos dezembros virão.

Assim que Theo contabilizar dez estarei setenta e seis. Quando ele estiver em idade de se graduar em qualquer faculdade, fazendo as contas, por volta de vinte e cinco anos, com que idade e estado de saúde estarei? Serão anos longos demais para quem agora conta com quase setenta. Meu saudoso pai nos deixou lacrimejantes aos setenta e sete. Caso o acompanhe, na sua despedida, certo que foi precoce para as gerações de hoje, me restam poucos dezembros para acompanhar meus netos, em suas caminhadas mundo afora.

O Gael nasce em findo agosto. Talvez início de setembro. Imagino que o receberei de braços abertos, fortes ainda para levá-lo a mesma praça do centro onde me encontro com o Theo.

Não sei quantos netos ainda terei. Netos são filhos açucarados. Imagino, no estar do momento, mais um engordará lista que se estenderá a três.

Tomara tenha ainda muitos netos vida adentro. Que os possa acompanhar nem que seja em seus melhores momentos. Mas, caso eles vierem a precisar de mim, quando a vida lhes for pesada demais, que os possa ampará-los, como aconteceu comigo quando ainda tinha, ao meu lado, meus pais.

Hoje, sete de junho, faria aniversário a minha querida mãe. Em dezembro, dia sete, completo mais um ano. Não sei quantos mais virão.

Agora o sol brilha. A temperatura ameniza-se. Logo mais deve esquentar.

Quando deixei a cama estava frio. Não tanto quanto nas manhãs madrugadas passadas.

Por ser dia sete de junho, ao pensar na data natalícia de minha mãe, ao voltar os olhos para os netos que terei, ao observar a beleza do querido Theo, com que olhos nascerá Gael, e outros netos que meus filhos me darão, ao imaginar o tempo de vida que me resta, quantos dezembros virão, passa-me um estranho sentimento no peito.

Melhor não pensar senão neste momento terminal. Minha mãe se foi há exatos treze anos. Meu pai nos deixou saudosos há outros tantos anos.

Quando pensei, nesta manhã, onírica de sete de junho, tudo isso ensejado por aqueles que me seguirão, em quantos dezembros virão, perdoem-me a angústia deste pensamento.

Tudo isso se trata de um reflexo impensado. Ou mal pensado. Deixe a vida andar como ela gosta. Viva intensamente o dia de hoje. Pois nem o futuro vai saber dizer quantos dezembros virão.

Imagine eu. Quanta pretensão…

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