Enfim um dia de sol

Como choveu durante a semana inteira. O céu, sempre emburrado, nada mostrava senão nuvens escuras. Nenhuma nesguinha de sol para alegrar os dias.

Zé Sem Sorte, sempre taciturno e sombrio, carecia de sol assim como da luz do dia.

Ele morava num arremedo terra, uma gleba pequenina, uma rocinha singela, herança de um tio aparentado longe.

Vivia da renda de um leitinho miúdo, que nos tempos de chuva aumentava um cadinho. Enquanto na entressafra minguava tanto que mal dava para encher um latão de cinquenta litros.

Era tido gente valente. Que levava cascavel na canela e não se importava com as agruras da vida dura que sempre enfrentava estoicamente.

Acordava ao nascer da aurora. Como despertador havia sempre um galo dependurado na porteira, o qual dormia pouco, e cantava antes da madrugada se fazer inteira. Seu apelido de Zé Sem Sorte lhe foi aplicado por um amigo. Um vizinho de cerca, sujeito brincalhão, que vivia a pilheriar com todos, esquecendo-se dos próprios defeitos.

A chuva decerto era bem vinda aos ares da roça. Era vital para sulcar a terra, nela lançar sementinhas de milho, dali nascerem pezinhos verdinhos, que, meses depois viravam pés de milho gigantes, cada um com quatro espigas prontas a serem colhidas.

Mas, quando a chuva era demasiada, como naquele ano aconteceu, outras inconveniências podiam suceder.

A lama grudenta impedia o trator de trabalhar. Era quase impossível de na terra molhada semear. Chuva misturada ao sol era o ideal para o povo da roça plantar.

Tudo tinha o tempo certo. Chuva fora de tempo só serve para estorvar.

Eis que chegou setembro. De repente nuvens escuras fecharam a boca do céu. Nada se via além da cinzentice do ar.

Numa sexta-feira, quase fechando o mês, desabou uma aguaceira tamanha que durou mais de um mês inteiro.

Zé ficava fechado em casa. Mal abria a janela, pois o cenário sempre cinzento lhe fazia mal.

O mês de setembro se foi. A primavera mostrou a cara. E nada de a chuva parar.

Bastante desolado, poder-se-ia dizer tristonho, Zé Sem Sorte, impedido de sair de casa, passava horas olhando o tempo.

O galo carijó nem cantava mais. As vacas atoladas no barro molhado não tinham como ir ao curral.

O leite despencou. A renda dele minguou. O caminhão leiteiro teimava em não descer o morro agudo, pois dali não sairia, nem que fosse guinchado por uma junta de bois.

Outubro continuou da mesma maneira. Nada de a chuva parar.

Zé sempre olhava pro alto. Céu azul, nem em pensamento.

Quando estava completamente desanimado pelas consequências do mal tempo eis que a chuva parou, de repente.

De novo a azulice do céu se mostrou reluzente. As nuvens escuras se foram. A alegria voltou aos lábios do Zé.

Naquela manhã, de céu azul, Zé quase não dormiu a noite. Sonhou com um dia de sol. Foi um sonho bom. E em verdade tudo aconteceu.

Ao acordar, vendo seu sonho se tornar real, de novo o galo cantou, foi depressa ao curral. A vacada, sem precisar desatolá-las do barro, deram mais leite que o costume. O caminhão leiteiro não teve medo de descer o morro. Tudo eram flores naquela manhã ensolarada.

O mês de outubro passou igual. A chuva serenou. Zé Sem Sorte acabou mudando de nome. Passo a se chamar de Zé Céu Azul.

Mas, assim que novembro chegou, as chuvas voltaram mais fortes ainda. O galo não mais cantou. A roça de milho pendoou. As vacas atolaram no barro. A alegria do Zé terminou.

Nada como um dia de sol. Mas, queiram concordar comigo. Assim como a chuva faz falta o sol também é vital.

Essa alternância de dias, de momentos de alegria e tristeza, fazem parte da gente. Nem sempre dias de sol são os melhores. Desde que a chuva caia, com aquelas gotas miúdas, nos fazem lavar a alma, desde que não seja impura.

Zé Céu Azul sempre espera a chegada da chuva. Como eu espero que o sol apareça, dentre as nuvens escuras.

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