“Zé Micuim! Isso não é carrapato não. Agora é a vez da próstata. Lembre-se que novembro é azul. Faça o exame antes que seja tarde”!

Novembro começou chuviscoso na roça do tal de Zé. Alcunhado de Zé Micuim dada à presença, quando menino, de um carrapatinho miudinho, que se instalou, num passado remoto, na pontinha do seu piupiuzinho, o qual era recoberto por uma pelinha fechada, como se um bico de lamparina impedisse o fogo de alumiar as noites escuras, por falta de luz naquela casinha tosca.

Devido ao fato o infeliz Zezinho foi privado de urinar. Só conseguiu a duras penas. Depois de o médico do lugar tê-lo operado de fimose. Deixando exposta a cabecinha daquele pênis minúsculo, que depois cresceu fazendo a alegria das meninas casadoiras do lugarejo onde vivia.

Zé cresceu. Sempre atarefado, tendo de cuidar do gado, carpindo pastos na estação de poucas chuvas, alimentando as vacas famintas, ordenhando-as duas vezes ao dia, colhendo ovos caipiras, fazendo todo o serviço da própria propriedade. Era uma rocinha pouco produtiva.

O renda do leite mal dava para suprir as próprias necessidades. Sobrava um cadiquinho. Graças aos negocinhos que de quando em quando fazia.

O tempo passava veloz para o homem da roça. No ano passado Zé completou exatos quarenta e cinco anos. Ele tinha saúde. Era feliz e bem o sabia. Zé só se lembrava de ter visitado um médico daquela vez, quando criança. Quando o esculápio o livrou de padecer da privação de urina devido a uma fimose mal resolvida.

Depois, graças à falta de tempo, as atividades rurícolas absorviam-lhe de manhã ao cair da noite, nem mesmo um examezinho de nada Zé fez. Embora aconselhado pela enfermeira do postinho de saúde situado na periferia da cidade vizinha à roça onde morava.

Como choveu naquela primavera, começo de novembro. Pela televisão, em branco e preto, que sempre saía do ar quando relampejava, Zé foi informado que teve início um tal de novembro azul. Mês quando os homens, passados os quarenta e cinco anos, deveriam fazer o exame de próstata. Uma glandulazinha que não faz mal aos mais jovens. Ao contrário. Ajuda na produção do líquido seminal. Veículo dos espermatozoides, células móveis que fecundam o óvulo, incapacitando os futuros pais de não dormirem durante a noite, graças aquele chorinho que nada tem de musical.

Zé, preconceituoso que sempre foi, relutou em se deixar invadir naquele local dito apenas de saída. Entrar por aquele orifício reconditamente escondido na cueca, jamais.

Novembro se foi. As chuvas serenaram. Quem não plantou milho perdeu um tempo precioso.

Zé Micuim chegou aos sessenta. Ainda pleno de saúde. Trabalhava de sol a sol. O tempo para ele era escasso.

Como nem todas as flores exibem cores, numa noite inesquecível Zé Micuim levantou-se para verter urina mais vezes que o costume. O jato saía espremido. Uma dor intensa acabou impedindo o pobre Zé de conciliar o sono.

Acordou sem conseguir urinar.  Sua bexiga cheia clamava para esvaziar.

Como vivia só, naquela madrugada fria, a quem recorrer? Todos ao derredor acorreram em socorro do infeliz Zé.

Um vizinho de pasto, que já fora operado de próstata, e bem sabia que aquele incômodo era devido a ela, levou o infeliz, num trator capenga, ao posto de saúde da cidade vizinha.

Zé ali chegou suando em bicas. Com a bexiga prestes a estourar. Por sorte, uma enfermeira experimentada pelas agruras a profissão, como não havia médico de plantão, teve a exata noção do sofrimento do paciente. E acabou por aliviar a dor do Zé enfiando uma sonda fina pelo canal da urina. Dali saiu dois baldes cheios. Os quais fizeram a felicidade do pobre portador de doença da próstata inchada.

Ao sair dali, já bem mais aliviado, agora disposto a se deixar examinar, quem sabe uma operação simplesinha o fizesse sorrir de novo, foi quando Zé Micuim se lembrou da própria infância.

Naquele dia, quando um carrapatinho escurinho instalou-se no seu piupiuzinho, privando-o de urinar, e ele foi operado de fimose encapada, agora as coisas mudaram. A fimose fora equacionada. Mas o tempo passou. Agora a doença se transformou. Novembro azul chegou. A próstata passou a incomodar.  Por que não se deixar examinar? Faça o toque sem retoque. Não faça careta que a coisa não dói.

Ao voltar à roça, com a tal sonda no canal da urina, o mesmo sujeito que o levou ao posto de saúde, zombeteiro que era, troçou do amigo dizendo assim: “Zé. Isso não é carrapato não. Agora é a vez da próstata. Novembro é azul. Faça o exame antes que seja tarde”!

E não é que Zé Micuim foi operado? Agora é porta-voz do novembro azul. Mijando como nos velhos tempos. Graças a uma operaçãozinha de nada. Que pode livrar o velho de maus piores

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