Prestes a inaugurar idade nova

Como seria bom se a gente inaugurasse anos com a mesma alegria com que  o menino assopra velinhas de um bolo enfeitado com elas.

Depois de certa idade as celebrações mudam. Não se faz bolos, muito menos festas ensejam.

Ao revés. O velho torce para que o ano seguinte seja tão somente e apenas realidade. E que a despedida seja adiada sine die. Que a morte não apareça tão cedo. Que a saúde predomine, dentro daquele corpo alquebrado.

Ao chegarmos àquela idade, depois de tantos anos de vida, seja ela feliz, ou recheada de contrariedades, as festas de aniversário são sobejamente esquecidas. Quase ninguém se recorda de quando um velho faz anos.  A não ser quando o tal idoso costuma presentear seus familiares com algum regalo qualquer. Pois, na bancarrota em que se vive, qualquer presente calha bem, desde que não se acostume a viver à custa do pobre avô, sustentáculo de uma família que vive na própria casa do pobre idoso, o qual vive da sua aposentadoria pouca, mas o suficiente para que todos vivam confortavelmente. Filhos cangurus são cada vez mais frequentes. Pena que a geração Nem Nem mais e mais prolifera, neste país onde o trabalho escasseia, como as águas que um dia irão pro mar.

Quando se avizinha um aniversário, prefiro dizer desaniversario, pois, uma vez idosos poucos motivos para comemorar existem, a data é sobejamente esquecida. E passa batido como a parada de soldados de um batalhão na data da independência do país. Cada um com passo certo. Pena que o velho, quando caminha, quase sempre claudica, trôpego, deve-se ter um cuidado imenso para que ele não tropece nas próprias pernas.

Mas, como até hoje não temos como evitar o envelhecimento, ele vem sem ser anunciado, não existe fórmula mágica para retardar a velhice.

A não ser que a caduquice se apodere de nós. Quantas vezes o velho volta a ser criança. Urina na calça. Tem de usar fraldões. E apenas engatinha quando seu corpo alquebrado pelas andanças da vida não tem mais força para se erguer da cama onde um dia vai se despedir da vida.

Certo que a melhor idade, tenho minhas dúvidas se esta expressão é correta, tem suas vantagens. Não pagamos passagem em ônibus. Temos uma fila só nossa. Somos ditos preferenciais.

Mas, na hora de receber a tal aposentadoria, que dura tanto quanto a florada dos ipês, é hora de recomeçar novamente a trabalhar. Pois, continuar vivo com o minguado salário é sinal de penúria e necessidades. E o pobre velho mal tem tempo de ficar assentado a um banco da praça, ouvindo o tempo passar.

No dia de amanhã insiro mais uma velinha a um bolo imaginário. São tantas que perdi a conta de quantas são.

Tenho receio de causar um incêndio caso as tantas velinhas caírem no tapete da sala. Quando assopradas por um dos meus netos. Com a força jovem dos seus pulmões.

Não sou contra envelhecer. Quem sou eu para contrariar as leis da vida?

Mas, caso me perguntarem a opinião, sobre o mesmo tema, deixo aqui, neste texto, recente, de hoje mesmo, véspera do meu desaniversario, qual presente gostaria de receber, nesta data que espero se repita por anos e anos. Nem quero saber quantos serão.

Primeiramente gostaria de receber saúde. Felicidade vem com ela. Tirocínio, alegria, fertilidade de ideias, são outras benesses que apreciaria muito ganhar. Receber amigos, no dia de amanhã, desde que não venham de mãos abanando, serão bem vindos. Parentes, espero que eles compareçam. Caso estiver ausente não se assustem. Por certo estarei em viagem para algum lugar imaginário. Se por acaso a campainha tilintar, e eu estiver no banho, voltem no ano seguinte. Se estiver ainda vivo por certo os receberei. Vestindo meu pijama listrado.

Não vou fazer a lista dos presentes que desejo ganhar. Não são presentes caros. Pois a amizade custa bem pouco. Apenas um abraço apertado gostaria de receber.

Dos meus netos desejo um beijo na face. Se possível, não seria pedir muito, um sorriso escancarado. Da minha esposa que ela continue a me acompanhar por muitos anos ainda. Quem sou eu sem a sua pessoa…

Dos meus filhos espero que a minha felicidade os contamine. Dos meus amigos, são tantos, espero não estar iludido, desejo ser presenteado com as suas amizades. É o bastante para quem viveu tanto. Cercado de amigos sinceros.

Prestes a colher mais um ano de vida, que aqueles que me restam sejam tão perfeitos quanto os que passaram. Que ainda tenha saúde e felicidade por estar vivo. Por anos e anos a fio.

Deixo aqui, nesta véspera do meu aniversário, que tenha a felicidade de estar com vocês, até no ano próximo, nos outros que ainda virão. Reparto com todos vocês a minha alegria de viver.

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