Dois Rios

Sempre que vou ao Rio de Janeiro volto deslumbrado.

O mar parece abraçar as montanhas. A areia fina nos faz caminhar devagar. Quem vai ao Rio definitivamente não pode deixar de tomar um banho de mar. Mesmo que seja breve. Um pular de ondas, um mergulho fugaz, um respiro daquela brisa suave que vem do encontro do horizonte que mais parece uma pintura, misturando loucura, com alguma coisa surreal.

Estamos em pleno verão. A cidade maravilhosa acolhe turistas do mundo inteiro. Mesmo para quem vem de Minas, entre suas montanhas, não se cansa de admirar aquele cenário paradisíaco. É uma faixa estreita entre o verde das serras e o oceano que parece cortejar a cidade. Com suas mulheres belíssimas. Mostrando aos nossos olhos embevecidos aqueles corpos semidesnudos, que parecem mostrar quase tudo, menos o essencial.

O carioca deixa transparecer alegria por todos os poros. É de fato um povo feliz. Não fossem as desigualdades. O imenso fosso social, aquilo seria um paraíso.

Pena que, ao lado das avenidas lindas, que percorrem a orla, convivem em afrontosa desarmonia barracos, miséria, pobreza, gente trabalhadora, que não tem onde morar, e tem de viver entre marginais que tiram proveito da violência, do tráfico de drogas, de toda a sorte de bandidagem, para se darem bem entre gente que apenas deseja continuar a vida admirando aquele cenário de sonhos, que bem poderia ser real.

Um dia, faz um bom tempo, tive a audácia de visitar a Rocinha. Ali fui levado pela curiosidade de escritor. Tomei uma vã no Leblon, onde morava minha pequena jornalista, pedi ao motorista que me deixasse saltar lá em cima, de onde se avista a praia de São Conrado.

Entre vielas estreitas, percorrendo becos de má fama, tive a sorte de ter um cicerone vindo do distante Nordeste. O nome do rapazola era James Bond. Foi ele quem me mostrou um pouco daquela favela enorme, maior que muitas cidades mineiras. Fui descendo ladeiras, até entrar no barraco do novo amigo. Ali moravam, além dele, a mãe, bastante obesa, um irmão mais velho, que dormia numa poltrona da sala, embora fosse hora do almoço. Recusei o amável convite para almoçar. A visita estava apenas no começo. E eu tinha de continuar meu périplo por aquelas vielas estreito, descendo o morro, até alcançar a orla, e respirar o respiro do mar de São Conrado.

A visita à Rocinha durou pouco mais de uma hora e meia. Despedi-me do James paraibano agradecendo-lhe a cordial recepção. Não vi nada de anormal. Nenhum ato de violência, felizmente nenhuma bala perdida se interpôs entre meu caminho e o mar.

Desta feita a visita à cidade tão difamada pela mídia se deu apenas num final de semana. O local escolhido foi a Barra. Assim que passamos pela linha amarela, depois de deixar a vermelha, olhando de lado, vislumbrei favelas beira mar, barracos construídos uns sobre os outros, piscinões feitos na intenção de atenuar o calor, e prédios altos tentando alcançar o céu azul, de um azul de doer os olhos.

Confesso que temi sofre um arrastão. Mas parece que a segurança do Rio agora está entregue em boas mãos.

Quem vive na Barra, naqueles condomínios de pessoas endinheiradas, vive noutra realidade.

Ali só entra quem se anuncia previamente. Passamos alguns minutos a espera que nossa anfitriã autorizasse o nosso acesso. Assim o fizemos.

Nosso hotel ficava pertinho de alguns Shoppings de grife. Visitamos alguns deles. Numa loja famosa pelas bolsas que eram expostas, o preço de uma delas era mais caro que muitos salários mínimos. Um cafezinho magro era mais caro que um lauto jantar num restaurante de minha Lavras querida.

O Rio continua lindo. Pena que existem vários Rios dentro daquela linda cidade, que bem poderia ser mais bonita ainda, não fossem estas disparidades.

Ao lado de prédios suntuosos convivem barracos insalubres. Convivendo entre si a miséria com os abastados.

Tomei um banho de mar na praia da Barra. Ali não tive gastos. Entrei e saí do mar sem dispender um tostão furado. Aí reside a beleza do Rio. O banho de mar ainda não custa nada.

Vendendo água gelada, nos sinais luminosos, gente obreira tomava sol sem se proteger. Grande parte dos motoristas nem se arriscava a abrir a janela. Temerosos de serem roubados. Triste cenário numa cidade tão rica, e ao mesmo tempo tão pobre.

Passamos dois dias no Rio de Janeiro. Mais uma vez fiquei encantado pelo cenário maravilhoso. Pena que existem, um ao lado do outro, dois Rios. Um onde a miséria impera. E o outro onde a opulência nos ofende os olhos.

 

 

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