Até quando?

Hoje o dia amanheceu ensolarado. Apesar de ser outono o calor ainda incomoda. Nenhum sinal de chuva no alto. Céu azul, sol claro.

Mais um dia desde que o ontem adormeceu. Quantos mais me esperam? Quantos anos mais viverei?

Não importa. O que conta é viver sempre carregado de alegria. Como o dia acordou risonho. Fresco, claro, alegre como eu.

Acordo cedo. Durmo pouco.

Há tempos tenho este costume arraigado dentro de mim. Procuro aproveitar ao máximo as horas do dia. Já que a escuridão da noite não me inspira nada. São apenas trevas. E nada mais.

Uma vez passado de certa idade o velho dorme pouco. Quando jovenzinho ainda o sono é mais profundo. Acordo mais de uma vez durante a noite. Não mais tenho sonhos. Eles se foram desde quando a mocidade se foi.

Parece que quase concluí minha missão nesta vida. Encaminhei um casal de filhos. Que me presentearam com três netinhos lindos. Quem sabe um dia uma meninazinha apareça. Para que este time não fique desfalcado de uma linda boneca.

Até quando estarei presente neste mundo tão lindo? Até quando poderei assistir ao despertar do sol e o clarume da lua? Até quando presenciarei o crescimento dos meus netos? São perguntas para as quais não tenho resposta. Tomara por muitos anos mais.

Meu pai viveu poucos anos mais do que os meus quase setenta. Nos derradeiros anos ele caiu à cama. Um ano inteiro observei seu sofrimento. Ele morreu em meus braços. Assim como minha querida mãe veio a falecer sob meus olhares de tristeza imensa. Ambos não mais estão presentes em carne e osso nos meus dias iluminados pela presença deste sol que hoje despertou cedo. Mas nunca deixo de me lembrar deles dois.

Até quando, indago, poderei assistir ao avoar de uma borboleta a pular de flor em flor. Bem sei que ela pouco vive. E eu pretendo viver bem mais.

Tudo faço para que a saúde não me abandone. Não tenho vícios maiores a não ser escrever. Sou dependente de exercícios físicos. Sem eles não consigo viver.

Até quando terei pernas fortes para me levar a todos os lugares pra onde vou. Corro quando a ocasião me apraz. Caminho sempre. Quase não uso carros para me locomover. Até quando? Tomara por muitos anos mais.

Até quando serei capaz de acompanhar meus netos em suas travessuras brejeiras? Não me canso de ir atrás deles. Ainda.

Até quando estarei exercendo a medicina? Deslocando-me sempre, indo e vindo, na intenção de amenizar a dor dos outros? Oxalá por muitos anos mais.

Até quando, não me canso de perguntar, a mim mesmo, a inspiração continuará a brotar dentro de mim como um riachozinho que vai desaguar num rio caudaloso? Quando livros mais editarei? Mesmo sabendo do pouco costume de ler do nosso povo brasileiro. Não importa. O que conta é fazer o que me apraz.

Até quando irei persistir na minha árdua tarefa de curar, de operar quando a indicação mostra, de tentar amenizar dores quando a ocasião enseja? Hoje ainda sou capaz. Amanhã, não sei.

Até quando, hoje estou consciente da minha missão, amanhã será outro dia, poderei acompanhar o desenvolvimento desta nação. Agora meio perdida entre encruzilhadas indecisas. Entre os desvarios de uma politica que não acerta seu rumo. Até quando viverei neste país tão lindo, e ao mesmo tempo tão desigual.  Tomara por pouco tempo mais.

Até quando, agora são quase sete e meia, a partir das oito o médico entra em cena, continuarei a viver em intensidade plena? E não estarei jogado a um leito inerme esperando a morte chegar?

A esta indagação não quero saber a resposta. Sinceramente não sei. O que vai ser de mim, será…

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