Lá fora nada se vê a não ser a escuridão de minhalma

Hoje amanheceu com uma névoa densa do lado de fora da minha janela.

A cama me acolhia prazerosamente. Fazia um frio agradável. Próprio de outono início de inverno. Mais tarde deve esquentar. O sol novamente deve brilhar. O azul do céu, no momento vestindo cinza, por certo deve azular.

Dias cinzentos não são agradáveis para quem tem a alma sensível. Prefiro o brilho do sol. O clarume do dia.

Em dias assim fico introspectivo. Poder-se-ia dizer que uma certa angústia brota dentro de mim.

Nada se vê, na linha do horizonte, a não ser a cinzentice do dia. Mal se enxerga a um palmo do nariz.

Ao sair de casa, antes das sete da manhã, percebo faróis acesos. Carros em movimento. Poucos se atrevem a sair de casa a esta hora da manhã.

Mas, no meu entender, dentro da minha sala, o prédio ainda vazio, é a melhor hora para deitar no papel tudo que me passa pelos pensamentos.

Minha vida até o presente momento. Tudo que me faz feliz. E o que me angustia.

A situação do país me preocupa sobremaneira. O desemprego cresce. A crise se alarga.

Quantos pais de família não tem o que dar aos filhos. Filas enormes se formam em busca de trabalho. Lojas fecham as portas. Indústrias demitem.

No entanto, alguns endinheirados detém a maior parte da renda nacional. E quem nos governa ainda não conseguiu mudar o status quo.  Eles batem cabeça cada um com sua opinião.

Daí a minha angústia nesta manhã quase madrugada. O dia amanheceu cinzento. Da cor da minha alma turva.

Sofro por ver a situação do país que tanto amo. E não enxergo, talvez devido à cerração, uma luz ao fim do túnel. Tudo se mostra cinza. Pouco se vê além de uma névoa densa que recobre o derredor. Dentro de mim da mesma forma a cinzentice não se desfaz. Tomara mais tarde o sol desperte e consiga vencer as nuvens.

Já eu, numa manhã como esta, onde nada se enxerga, da mesma forma minhalma não se abre a luz do dia. Sinto-me como se um torpor empapasse-me o discernimento.

Sou dependente da luz. Do brilho do sol. Da alegria que os dias ensolarados depositam no meu âmago agora infeliz.

Não tenho como mudar meu cerne. Simplesmente sou assim.

Nesta altura dos meus quase setenta anos não tenho como mudar. Vou vivendo ao sabor da luminosidade das manhãs. Em dias nevoentos sinto-me com um pássaro sem poder voar. Uma avezinha caída do ninho sem estar preparada para voos solos.  Um filhote sem ver a mãe. Uma criança sem poder brincar.

Agora são sete horas da manhã. O dia ainda se mostra nevoento. Mais tarde o sol deve despertar.

Não faz tanto frio. Aqueço-me pondo pra fora o que me angustia.

Mais embaixo o casario cinza ainda dorme. Apenas eu, e minhas lucubrações, são expostas do lado de fora da minhalma. É a maneira que encontro para me livrar da angústia que me atormenta.

Sou refém do clarume do dia. Do brilho do sol. Da azulice do céu.

Para aliviar a sofreguidão da minha inquietude escrevo. Somente assim me sinto confortável. Já que o dia amanheceu cinzento. Como minhalma se sente. Nesta manhã de quase inverno. Neste outono quase findo.

Minhalma sente-se entorpecida em dias como este. Não tenho como mudar. Simplesmente sinto.

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