Velhas recordações

Inda me lembro, saudades avoam, quando, na minha infância, perdida na lembrança, tinha ao meu lado meus pais.

Naquela rua, naquela casa, tinta de saudade, paredes caiadas de amarelo pálido, que se deixa ver pelos fundos, foi que passei os melhores anos de minha vida.

Ali não nasci. Foi em outra cidade. Mas, que eu me lembre, apenas cinco anos ali vivi.

A rua era outra. De nome Coqueiral. Um dia passei por lá. Entrei na mesma casa onde vim ao mundo. Quem me recebeu foi o filho da velha senhora. Ela se chamava dona Didi.

Foi ele quem me disse, que aos fundos da velha casa havia um pé de camélia rosa. Entretanto ele não mais existe. Decerto está morto. As camélias morreram. No entanto meu passado não consigo sepultar.

Meu pai era funcionário da casa bancária que leva o nome de nosso país. Quando tinha cinco anos passei a morar nesta cidade linda.

Foi exatamente naquela rua, a Costa Pereira, que passei a infância. Doces lembranças. E como ela está mudada. Poucos vizinhos ainda habitam aquelas casas. Hoje desfiguradas. Transformadas em clínicas.

O velho hospital modernizou-se. Metamorfoseou-se como um borboleta. Mas ainda conserva em sua intimidade a mesma hospitalidade de antão.

Foi lá que ensaiei meus primeiros passos na vida de médico. Ainda me lembro do doutor Zé Botelho, que saudade do doutor Jesus, doutor Dilermando, doutora Dâmina, e outros esculápios pioneiros, que ajudaram a edificar aquele nosocômio, tão amado pela população.

Voltando mais atrás, quando era menino, ainda me passam pelas lembranças o mesmo clube pra onde vou ao cair das tardes. O Lavras Tênis Clube tem a minha idade. Ambos nascemos no mesmo ano. Contamos na presente data com quase setenta anos.

Mas parece que foi ontem. Como o tempo passa na velocidade do vento.

De vez em quando me pergunto: “pra onde foram os meninos da Costa Pereira”?

Muitos deles já passaram ao além. Tornaram-se estrelinhas miúdas em noite enluaradas. Ou agora são avós. Como eu me tornei.

Minha infância foi recheada de momentos únicos. Que saudade me trazem as férias de dezembro. Mês do meu aniversario.

Era numa fazenda de um tio meu onde passava o mês inteirinho. Na companhia de umas primas de Varginha.

Talvez seja por este motivo que mais tarde, homem feito, tomei gosto pelas coisas da roça.

Agora, nesta altura da minha vida, infância perdida, inspirado pelo tio Zito Abreu, passei a ser fazendeiro de fim de semana.

Mas logo percebi que para ter lucro nesta profissão carece estar presente a todas as horas do dia. E eu, ainda longe da aposentadoria, só tive prejuízos na atividade rurícola.

E passei adiante este meu sonho de fazendeiro a quem entende de vacas e suas crias.

Poucas vezes me ausentei desta cidade. Completei minha formação profissional na capital do meu estado.

Mas para aqui retornei sedento de saudades. E espero continuar nesta minha cidade, não de berço, e sim de coração, até o final dos meus dias.

Que eles se encompridem por longos anos. Para que eu tenha de me recordar sempre.

Agora, quando contemplo aquela rua, de tantas lembranças ternas, com o coração recheado de emoções, tento escrever sobre velhas lembranças.

E elas me fazem bem. Permitem-me olhar pra trás. Sem me olvidar das pessoas queridas. Que se foram. Num dia distante. Mas ainda estão indelevelmente presentes nas minhas lembranças. De um saudosista nato. De um ancião com alma de menino.

Recordar é viver. Nunca se deve esquecer. Bons momentos são para serem guardados. Num velho baú. Hermeticamente fechado. Cuja chave deve estar escondida. Num local onde apenas nós sabemos. Pois, viver do passado, nunca esquecendo-nos daqueles que nos são caros, para mim trata-se de um estilo de vida. Não de morte. E sim de saudades.

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