A cada dia que nasce, a cada despertar do sol, a cada manhã que se faz, acordo sempre a mesma hora de sempre.
Dizem que velho tem o sono leve. Dorme pouco.
Tenho por mim que a razão é singela. Aproveito a luz do dia para viver em sua intensidade máxima.
Por que motivo passar horas a fio na escuridão da noite se não sabemos o que nos espera o amanhã?
Daí a minha predileção pela luz do dia. Durante a noite, envolto na escuridão, de olhos fechados, mal sabemos como foi o dia de ontem. A noite é uma perda de tempo. Já que o mesmo tempo para nós é fugaz. E nem sequer antevemos o que vamos passar de agora em diante. Quantos anos mais viveremos. Até quando a saúde vai nos acompanhar. Até quando a clarividência vai fazer parte de nós.
Tenho pelas madrugadas o maior apreço. E não posso dizer o mesmo pela noite.
Antes das cinco abro a janela. Deixo o clarume do dia entrar.
Caso seja um dia escuro não me importo. Acendo a luz dentro de mim. Abro os olhos de mansinho. E imagino, com meus pensamentos que avoam, como vai ser o dia que nasce.
Deixo minha casa antes das seis da manhã. Agora caminho pouco. Tomo meu cafezinho magro no meu consultório. Ligo o computador. E espero as oito horas chegarem. Aí mudo de vestimenta. De escritor me torno médico. Sou duas pessoas numa só.
A cada renascer de um novo dia as esperanças se renovam.
Durante a entrada da noite evito os noticiários. Sempre comentam as mesmas coisas: desemprego, violência, roubalheira, assaltos, podriqueiras.
Notícias boas são exceções a regra. Não tenho visto alguém comentar sobre a vitória da bondade sobre a maldade. Acredito que apenas a maldade vença.
Durante o renascer de um novo dia observo a luz que adentra pela minha janela. Nenhum sinal de chuva no alto. Apenas nuvens fugidias se deixam ver. O clarume do sol ofusca-me a retina.
O calor parece que mais tarde vai se fazer sentir.
Neste cinco de novembro, recém-parido, é mais um dia que renasce. Com ele conto nos dedos quase setenta anos. Quantos dias são passados? Quantas horas se foram? Trata-se de uma contagem difícil de fazer.
Hoje renasceu um novo dia. Dia quente. Temperatura em ascensão.
Aos quase setenta anos conto os dias que ainda me restam. Bem sei que se deve viver o dia de hoje. O amanhã a nós não pertence.
A cada renascer de um novo dia parece que foi ontem. O dia em que nasci.
Daí a sensação de renascimento que me desperta a cada dia. Sinto-me como se fosse uma criança dormindo. Agora, a esta hora, meus netos devem estar acordando.
Através deles, com eles, renasço. A cada dia que passa sinto-me mais jovem ainda.
Pena que seja apenas uma ilusão. Que se desfaz a cada dia.
E como o tempo passa. Nem parece que foi ontem. O dia em que nasci.
