Até quando serei capaz?

Em menino, esperto e traquina, fazia de tudo um pouco.

Brincava de pique-esconde. De finca e bete fazia estripulias. Mas, o que mais apreciava era olhar as menininhas depois da missa das dez, no rela do jardim.

Não via a hora de o padre dizer: “vão em paz o Senhor os acompanhe”. E lá ia eu. De terno engomadinho, correndo até o jardim. Creio que contava com seis ou sete anos. Quantos anos faz… Minha infância passou.

Que saudade dos verdes anos. Daquele colégio onde aprendi as primeiras letras.

Aos menos de dez já estava bem crescidinho. Não tanto, como desejaria.

Foi naquela rua, que daqui se avista, onde, eu menino, passei os melhores dias de minha vida.

E naquele clube, da mesma idade que hoje tenho, foi que aprendi que o esporte faz bem não apenas ao corpo assim como a mente.

Antes era capaz de fazer quase tudo. Sentia-me o senhor menino das artimanhas.

Pena que a vida nos faz adultos. E deixamos a mocidade se perder na esteira rolante do tempo.

Hoje, setentando, ainda sou capaz de fazer tantas coisas. Não mais vou à missa. Nem passo pelo jardim a fim de ver as lindas meninas que hoje são avós.

Mas, contrariando a passagem dos anos, ainda sou capaz de fazer quase tudo. Ainda penso ser menino. Um setentão com alma de criança.

Corro como não corria dantes. Nado como uma calopsita de asas quebradas. E penso tanto, tanto, que quase não durmo mais. Deixo o sono de lado. Para os mais jovens. Que pensam ter todo o tempo do mundo. Mal sabem eles que o tempo se esvai como as águas das cachoeiras que descem ladeiras e não voltam mais.

Ainda sou capaz de sonhar. Embora sejam sonhos distintos de quando era jovem menino.

Meus sonhos de agora são meras quimeras. Bem sei que o tempo se esvai. Não deixando pra trás muito tempo para pensarmos em nós.

Ainda sou capaz de pensar na vida que tenho levado. E como tem valido a pena viver.

Ao lado de minha família, dos netos que eu tive, dos filhos que me presentearam com netos.

Ainda me sinto capaz de trabalhar por muitos anos mais. Tenho saúde de sobra. Felizmente as enfermidades tem me dado trégua. Até quando? Por vezes me indago. Seria muita pretensão de minha parte pensar que vou viver mais que uma eternidade.

Sinto-me capaz de sonhar. Pois sem sonhos não se vive. Muito embora minhas ambições sejam outras. Penso ter conquistado quase tudo. Ainda me faltam poucas coisas.

Sendo capaz de sonhar, de viver com alegria e prazer, pra que desejar mais?

Ainda sou capaz de conviver com minhas lembranças. Doces recordações da minha infância.

Daqueles verdes anos que não voltam mais.

Até quando serei capaz? Só peço que me deixem em paz. Até quando a vida cessar. Dentro de mim.

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