Até que enfim…

Parece que foi ontem. Nem contam os setenta anos que se passaram.

Foi naquele ano distante que vim ao mundo. Precisamente no dia sete de dezembro de um mil novecentos e quarenta e nove.

Fui apresentado à vida numa cidade perto. Na bela Boa Esperança que hoje é banhada por um lago enorme. Poucas vezes voltei àquela cidade. Não por falta de saudades. E sim por considerar onde moro como meu berço em verdade.

Ainda me lembro daquela pracinha cercada de árvores. Foi ali que uma tia querida tentou aquietar-me a sofreguidão. Naquela fotografia que ainda se mostra às minhas costas ela, tia Cida, segurava o sobrinho primeiro com ares de felicidade. Algumas vezes ela voltou. Acompanhada de meu avô Rodartino. O mesmo que morava pertinho de onde estou. Num edifício nomeado em sua homenagem edificado por meu saudoso pai.

Da Boa Esperanca de antão poucas lembranças ainda restam no meu coração. Também fazem tantos anos que nem me lembro mais. Ali permaneci até os cinco anos. Por motivo de mudança acabei me transferindo para aquela mesma rua por onde sempre passo. Ao cair das tardes.

Naquela casa hoje habitada por uma irmã querida foi que ensaiei meus primeiros passos. Meu quartinho ainda se mostra de janelas fechadas. Rosinha ainda dorme. Não é madrugadora como seu irmão.

De vez em sempre me surpreendo caminhando por aquela mesma rua. Era calçada de paralelepípedos. Que mais tarde foram cobertos por asfalto.

Lembranças se vão. Saudades ficam.

Por mais que tente não consigo me desvencilhar do passado. Ele sempre me atrai. Não me atraiçoa.

Até que, num dia destes, nestes tempos difíceis por que passamos, voltei àquela mesma rua. O clube onde sempre ia estava de portas fechadas. Como me faz falta a academia. Tomara logo ela volte à mesma atividade. Até quando? Ainda não sei.

Maio quase fecha os olhos. O outono ainda acontece antecedendo o inverno.

Hoje o dia se mostra lindo. Céu azul, sem nenhuminha nuvem a empanar o brilho do sol.

Até que enfim redescobri o que foi feito de mim. Deixei a criança num passado distante. Agora ela se mostra nos olhos dos meus queridos netos. São três. Neles me renovo. Volto à infância através de seus folguedos.

Até que finalmente voltei a ser criança de novo. Na parte da tarde, quando o tempo me permite, volto a brincar com eles.

Naqueles olhinhos risonhos me traslado a minha infância. Apesar de longínqua ela ainda existe.

É como se brincasse na mesma Boa Esperança. Ao lado dos meus pais que se foram.

Até que enfim, neste dia lindo de outono, voltei a encontrar-me naqueles verdes anos.

É como se o passado voltasse. E minha idade retrocedesse.

Pena que o tempo não volta. Mesmo assim faço de conta que até que enfim me tornei de novo criança. Naquela mesma rua onde passei minha infância. Saudosos anos que não me saem das lembranças.

Até que finalmente me percebi menino. Doces recordações. Indeléveis lembranças que tento guardar num lugar especial.

Até que enfim consegui. E não desejo nunca me olvidar do quanto fui feliz e ainda sou.

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