” Lastimar de quê”?

Hoje o dia amanheceu de uma formosura de dar gosto a qualquer moçoila casadoira.

Céu azul, sol a bilhar, nem quente ao exagero, muito menos frio ao destempero.

Mais um final de semana a contar nos dedos. Amanhã é sábado. Em dois dias recomeça a semana. Em alguns meses apenas finda mais um ano. E eu, no alto do meu conforto, sossegadamente emancipado, quase em final de linha, aqui estou a lamentar o estado de coisas que o mundo inteiro atravessa.

A tal pandemia parece não ter fim. Ela começou a nos importunar faz tempo. Não se fala noutra coisa. E, de nada adianta tentar mudar de assunto. Só se fala em mortes. Como se a vida fosse um acontecimento banal. Sem motivo a celebrações.

Crise, desemprego, miséria, acidentes como o acontecido no Líbano, enlutam as páginas sedentas de sangue da mídia. Até parece que a felicidade deixou uma lacuna imensa em seu lugar. Nos dias de hoje só se comenta sobre tristezas. Famílias entregues ao desalento. O comércio tentando se reerguer. Apesar das enormes dificuldades em conseguir restabelecer seu ritmo de dantes.

Aqui estou a comentar sobre as fatalidades. Esquecemo-nos de falar de flores. E elas desabrocham neste inverno ameno. Enfeitando com seus matizes coloridos a natureza em festa.

Absolutamente não tenho do que reclamar. Nestes mais de setenta anos de vida só tenho motivos para alegrias. Muito embora os instantes de melancolia façam parte uníssona da minha existência, se contabilizar quem leva vantagem, por certo serão os momentos de felicidade explicita.

Tenho dois filhos que me presentearam com três netinhos lindos. Nasci de pais amantíssimos. Infelizmente não mais os tenho ao meu lado. E como gostaria de novamente poder abraçá-los. E junto deles passar momentos de pura alegria.

Reclamar de quê? Da vida que tenho levado? Da saúde que ainda desfruto? Da linda profissão que elegi? Da inspiração que me cavouca a cada dia?

Felizmente só tenho motivos a agradecer. Bem sei que muitos passam por dificuldades. Principalmente aqueles desempregados. Que fazem fila à porta dos bancos. A espera daqueles caraminguados. Única fonte de renda que ainda lhes resta.

Pena que não possa ajudar a todos. Dentro das minhas posses tento fazer a minha parte. É pouco. Não tenho como discordar.

No entanto, neste dia maravilhoso, sol a pino, céu azul ao desatino, neste final de semana que se anuncia, deixo a vocês, amigos ou simpatizantes, conflitantes o diletantes, os meus mais sinceros votos de vida longa. Saúde a emprestar aos outros. Que a felicidade inunde seus lares.

Que as reclamações se reduzam a quase nada. Que o tal momento de intranquilidade passe logo. E que recuperem o bem mais precioso que fomos presenteados ao nascer.

A vida. Que ela seja recheada de alegria.

Um amigo meu, gente boa nascida e criada na roça, mãos caludas, tez tostada pelo sol, quando por ele passo, na volta pra cidade, e paro um cadinho, e tento desfilar meu rosário de queixumes, ele logo retruca: “lastimar de quê? Tenho tudo que sempre desejei. Vontade de trabalhar. Experiência em saber identificar entre o bem e o mal. Aqui estou, nos meus quase oitenta anos, a espera do momento final. Que ele venha sem maiores percalços. Durante a noite. Se possível for”.

É. Realmente não tenho do que reclamar. Tudo passa. Até a uva vira passa. E eu por aqui passarinho. Sem poder avoar.

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