Sexta-feira treze…

Pra muitos é dia de azar. Já outros não pensam assim.

Pra mim tanto faz como tanto fez. Quem faz o azar são as circunstâncias.

Se a gente pensa na fortuna. E faz por onde acontecer. Nada nos impede de atingirmos nossos objetivos. Só depende da gente correr atrás de nossos sonhos. E iremos certamente alcançá-los. Com esforço, desprendimento, dedicação, suor no mourejar constante, um dia vamos compartir com a sociedade tudo aquilo que almejamos.

E era bem isso que aquele garoto esforçado, nomeado Zezinho, sempre buscou na sua trajetória vida afora.

Elezinho nasceu numa familia de poucas posses. Aos seis anos completos começou a estudar.

Não por desejar fazê-lo antes. E sim por absoluta impossibilidade de se matricular numa boa escola. Já que tinha de ajudar ao pai no sustento daquela casinha pobrezinha. Fincada no alto de um morro. De onde se via a cidade, lá do alto, feericamente iluminada durante a noite escura.

Zezinho sempre alimentou um sonho. Gostaria, desde muito jovem, de cursar a faculdade de medicina.

Pretensão esta considerada inatingível. Pois, enfrentando toda a sorte de dificuldades, sem lastro, nascido numa comunidade onde balas perdidas quase sempre encontram o alvo errado, acenavam-lhe pouquíssimas chances de ser dar bem na vida. Mesmo assim persistiu. Desanimar não constava no seu vocabulário.

Aos quase dezoito anos, estudando com afinco numa escola enfiada no meio do morro, o jovem, contemplado com notas acima da média, teve a chance de fazer o exame do ENEM.

Enfim a sorte a ele prevaleceu.

Graças às notas altas enfim se matriculou numa escola de medicina de bom conceito. Tinha de conciliar o trabalho com os estudos.

Estudava durante o dia. Trabalhava num balcão de padaria durante as madrugadas.

Seis longos anos se passaram.

Zezinho fez-se doutor. Mas gostaria de ir mais longe.

Uma especialidade cirúrgica o seduzia. Durante os estudos de anatomia dissecava os cadáveres com uma destreza que saltava aos olhos.

Ao final daquele ano conturbado, numa crise resultado de uma pandemia que não tinha fim, afinal nosso doutor conseguiu seu intento.

Foi aprovado na residência de cirurgia geral. Foi ali, naquele hospital referência em queimados, que o nosso doutor aprendeu manusear o bisturi com destreza tamanha, que logo foi chamado a dar plantões numa unidade de pronto atendimento, pra onde eram trasladados acidentados graves, oriundos de todas as comunidades ao derredor.

Foi numa daquelas noites escuras, frias de enregelar, quando chegou, de repente, trazido por uma ambulância estridente, um jovenzinho atropelado, com múltiplas fraturas, em estado gravíssimo.

Ele, por sorte, ou teria sido por azar, acabou caindo nas mãos ainda não experientes do jovem cirurgião.

O especialista, neófito no assunto, levou o paciente ao centro cirúrgico.

Aquele corpicho jovenzinho se esvaia em sangue. Em estado de choque hipovolêmico foi atendido.

Mas, naquela sexta-feira treze, faltou sangue naquele pronto socorro.

Apesar das tentativas malogradas o infeliz acidentado veio à óbito.

E a familia, desconsolada, acabou por culpar o pobre médico pelo insucesso do atendimento.

E tudo aquilo, embora não tenha tido culpa, jogarem-lhe aos ombros frágeis culpa maior que ele não tinha.

E o pobre doutor Zezinho, médico com um futuro brilhante, foi processado por negligência e imperícia.

Desde então o jovem esculápio, não tendo como pagar a um bom advogado, foi impedido de exercer a nobre profissão.

A sua carreira naquela sexta-feira treze teve fim.

Não sei se por sorte. Ou por azar. O fato retrato é que isso tem acontecido com certa frequência. Não por culpa nossa. E sim de um sistema falido.  Que nos joga aos ombros culpa maior que não temos.

 

Deixe uma resposta