Perdas e ganhos

No meu envelhecer tenho pensado unicamente nisso.

Nas perdas e ganhos que a gente coleciona ao saber dos tempos.

Em criança, quando ganhávamos qualquer presente. Logo um sorriso mostrava nossos dentes ainda de leite.

Mas, desastrados que éramos. O tal brinquedo, não muito resistente, logo virava cacos. E lágrimas genuínas escorriam pela nossa face. E não secavam tão cedo.

Mesmo tentando nos consolar o colinho macio de nossa mãezinha.

Nestes verdes anos os ganhos suplantavam em muito nossas perdas.

Perdíamos uma bolinha de gude. Mas ganhávamos um jogo de botão novinho. E com aqueles jogadores por sobre um tampo de mesa passávamos horas e horas tentar enfiar uma bolinha achatada por dentro de um travezinha trôpega.

Anos deixavam rastro na esteira do tempo.

Já aos vinte anos as perdas eram muito sentidas.

Aquela linda mocinha um dia desdenhou de nós. Disse não à corte que a ela fazíamos.

E a gente, ainda um tanto inocente, partíamos rumo à outra conquista.

Ganhando a simpatia da mãe da moça. Mas um dia perdemos por termos tentado afanar um beijinho da mesma no escurinho do cinema.

Já aos trintanos, já as vésperas do casamento. Depois de pensarmos ter ganhado o sim da donzela. E ela não o deu. O casamento foi desfeito antes mesmo de ser consumado.

Mesmo assim a vida continua. Entre perdas e ganhos.

Já a partir dos quarenta, depois de embarcados noutra canoa furada. Pensando termos escolhido a parceira ideal para dividir nossa vida.

Não só perdemos o prumo. Pois os ganhos em nossa profissão não eram suficientes para viver condignamente. E mais uma vez perdemos quase tudo. Só nos restando a dignidade. Que foi perdida anos mais tarde.

Assim que a velhice se apoderou de nós.

Quando ficamos velhos perdemos os dentes. Mas ganhamos uma dentadura novinha. Pena que ela foi esquecida não se sabe donde.

Já que, ao envelhecermos perdemos a capacidade de nos lembrarmos. Afinal são tantos anos que ficaram pra trás que somos atraiçoados pela nossa memória. Que cada vez mais perde neurônios. Uma consequência inevitável do envelhecimento.

Depois de certa idade perdemos a capacidade de sentir prazer nas coisas mais sucintas. Mas não perdemos o amor que sentimos pelos nossos netinhos. Pessoinhas lindas que são a continuação de nós mesmos.

Aos mais de tantos anos sentimos que perdemos quase tudo. Mas tomara não percamos o respeito e a consideração daqueles pelos quais tanto fizemos.

Perdemos, com a idade chegando, a audição e o andar fica trôpego. Mas oxalá ganhemos um ombro amigo onde a gente possa se escorar. Já que a velhice um dia vem.

E ela chega a galope. Sobrepondo perdas e ganhos em nossa existência.

Até o dia quando ganhamos uma lápide em nossa sepultura.

Onde se pode ler essa inscrição: “a vida se sucede entre perdas e ganhos. Ganhamos um dia. Noutro perdemos quase tudo. Menos a capacidade de amar e sonhar com fatos que marcaram nossa mocidade. Pena que ela se foi há tantos anos. Que nem nos lembramos mais”.

 

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