Resquícios do meu eu

Hoje, bem cedo, acordei com o sol entrando pela minha janela.

Trata-se de uma sexta-feira de sol. Depois de um longo período chuvoso.

Parece que a chuva vai dar tréguas. Algumas nuvens cinzentas tentam tapar a boca do sol.

Faz calor. É verão.

Nada contra a chuva. Mas, quando ela cai em demasia provoca transtornos. Barreiras descem das encostas. Pessoas são soterradas pela lama. E perdem a vida quando menos esperam.

Nesta linda manhã de sexta-feira, ao acordar, e olhar pela janela do meu quarto, deparei-me com cenas do meu passado.

Lá estava eu, menino, brincando naquela rua que se deixa ver pelos fundos.

Eu menino, lourinho como meu netinho Theo, brincava com outros amiguinhos.

Por onde andam os meninos da Costa Pereira? Já fiz esta pergunta de outras vezes.

Aquela mesma rua não tinha asfalto. Era de terra batida. Depois a cobriram de paralelepípedos. Que ainda estão por debaixo daquela manta asfáltica. Escondidos, carcomidos pelo tempo, mas ainda resistente à passagem dos carros.

Naquela casa, a de número 152, morava eu. Junto a mim viviam meus pais. E meu irmão mais jovem. Que nos dias de agora vive em Belo horizonte. Onde passei parte da minha juventude.  Onde me formei nos idos anos de 1974.

Neste dia maravilhoso, prenúncio de um final de semana, acabei voltando ao meu passado. Pena que os anos não voltam. E nem eu gostaria que assim fosse.

Bem sei que o passado nos traz agradáveis recordações. Mas da mesma forma sei que o presente é o que importa. Mas, como controlar a saudade? Como não desejar que retorne a mocidade? Pra onde foram meus vinte anos? E meus desenganos? Pra onde irei eu?

Eu menino brincava naquele clube que envelhece junto comigo. Ainda passo por ali algumas horas ao cair da tarde.

As brincadeiras de antão eram diferentes. Não existiam os celulares. Tínhamos de brincar com bolinhas de gude, pular amarelinha, jogar bete, finca, e de pique- esconde numa moita de capim, num cafezal antigo que existia nos fundos de minha casa. Onde hoje é a Rua Horácio de Carvalho, onde morou minha primeira professora, dona Beliza, e onde ainda mora sua filha, a querida Biló.

Saudades daqueles verdes anos. Saudades dos meus pais. Dos meus amigos de infância, que não vivem mais neste mundo.

Ainda agora, sol brilhando forte, olho pela janela do meu consultório, e revejo parte do meu passado.

A Rosinha ainda dorme. A casa onde morei está de janelas fechadas. O clube onde passei minha infância por certo já acordou.

Quase sempre volto ao passado. Sem querer retorno. Bem sei que ele fica cada vez mais distante. E não espero retroceder tantos anos.

Mas, como fazer para não me esquecer daqueles tempos onde passei meus melhores momentos?

Assim vivo. Melhor, sobrevivo.

Agora, velho assumido, idoso não consentido, tento rever os resquícios do que fui.

Enquanto durar minha estada neste mundo dos vivos. Enquanto perdurar meu desejo de viver.

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