Vivo de lembranças

Um dia me perguntei. Qual o combustível que move a vida?

Em minha opinião nada mais é do que – saudade, recordações, inspiração, paixão pelo que fazemos, lembranças que guardamos dentro da gente, e, sobretudo, viver bem de acordo com a própria consciência.

São requisitos básicos para tentar alcançar a felicidade. Embora ela seja difícil de ser encontrada. Já que a mesma pode se esconder numa curva da encruzilhada. E se camuflar como um camaleão trocando a pele na tentativa por vezes inglória de fugir de um predador.

Minhas lembranças me acompanham desde o tempo de criança. O passado me seduz. O presente vivo olhando sempre em direção adonde fui um dia menino. O futuro tem a incertidude de um jovenzinho sem saber o que o espera. Mas as recordações não se desgrudam de mim. Elas têm um lugar cativo dentro de meu corpo ainda rijo aos mais de setenta anos.

Se disser que lembranças não são importantes minto. Já que não tenho a capacidade de omitir a verdade.

Elas avoam longe no tempo.

Do dia em que nasci apenas meus saudosos pais poderiam testemunhar.

Não foi aqui nesta cidade. E sim noutra perto de nome Boa Esperança.

Não tenho a esperança de de novo revê-la. Quem sabe um dia levarei meus netos para a ela conhecer.

Lembro-me sim. Graças a uma fotografia em preto e branco que trago às minhas costas. Eu menino, num lindo terninho azul marinho, de dedinho em riste simulando uma pistola, apontando para um lugar nenhum. De pé numa pracinha daquela cidade. Lourinho como meu netinho Theo. E noutra foto na mesma moldura, amparado pela querida tia Cida. Sonolento talvez esperasse a volta de meus pais. São recordações que movem minha vida. Nestes setenta e quatro anos completos em dezembro passado.

Já maiorzinho, uma vez em outra rua, que daqui se avista bem perto, aos cinco anos pra Lavras me mudei.

A Costa Pereira me fita com olhos de saudade. Como se dissesse: “menino Paulinho. Volte a morar aqui. Sinto saudades dos seus tempos de menino. Agora estou bem mudada. A casa dos seus pais não existe mais. Aquela, no começo da rua, onde morava seu avô Rodartino, hoje tem um prédio em seu lugar. A velha jabuticabeira não existe mais.”

Confesso que quase voltei no tempo. Pena que somente em pensamentos me é possível. Em corpo e alma apenas em sonho me permito.

Continuo a viver de lembranças.

Eu, não mais criança, jovenzinho, para aquele colégio me transportei. Cujo uniforme ainda tem as mesmas cores verde e branca. Foi lá que teve começo meu aprendizado. Que ainda continua graças ao bom Deus.

Já de maior idade, antes de chegar onde estou, foi quando fui estudar na capital. A linda Belô nunca me pareceu tão grande. Morava num amplo apartamento nas proximidades do parque municipal. Era uma república democrática. Onde quando um ia estudar o segundo fazia silêncio.  E respeitávamos a privacidade um do outro.

Remeto-me aos idos anos de um mil novecentos e setenta e quatro. Ano mágico. Quando me graduei em medicina.

Três anos depois na minha amada Lavras cheguei. Com a maleta de médico repleta de sonhos. Muitos se concretizaram. Alguns ainda são deixados pra depois.

Hoje, aos setenta e quatro janeiros, ainda sou movido a lembranças. Doces recordações me movem a frente.

Meu combustível se chama esperança. Em dias melhores pra cada um de nós.

 

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