Faz-me falta…

Nesta altura da minha vivência, nestes tempos secos, de isolamento, nesta fase da vida, depois de anos e anos corridos, tanta coisa me faz falta.

O achego de minha família. O ar que respiro. Embora, com o secume que tem feito minhas narinas sempre acordam entupidas.

Da mesma forma me faz falta o sorriso envolvente das crianças. O alegre alarido que elas fazem quando se cruzam comigo. O afago que recebo dos meus netinhos.

Faz-me falta o acordar do sol nestas manhãs de inverno. Assim como acordar cedo. E sair às ruas quando elas ainda estão vazias. As noites escuras não me fazem falta. A elas prefiro o clarume das manhãs. O despertar do sol. A azulice do céu. O farfalhar de asas dos passarinhos. O voo frenético do beija-flor. As flores desabrocharem depois de uma chuva mansa.

E como me faz falta a liberdade de ir e vir. Nada como correr desarvorado pelas estradas. A procura de quê? Do nada.

Faz-me falta acordar cedo. Caminhar pelas ruas ainda semi desertas. E algum madrugão desejar-me bom dia. E eu retribuo da mesma forma.

E como ainda me faz falta o exercício moderado da medicina. Sem ela não vivo. Ainda longe pretendo estar da aposentadoria.

Faz-me falta ainda o convívio com as crianças. Entre elas me sinto a vontade. Brinco, finjo que a idade ainda não me cavalgou as costas. Junto delas retrocedo à doce infância.

E ainda me faz falta o abraço fraternal dos meus filhos. Já que não posso mais abraçar meus pais. Que se foram para junto do infinito.

Faz-me tanta falta o prazer inenarrável de prosear com a gente boa da roça. Com eles aprendo muito mais do que nas enciclopédias. Quando a vaca vai parir. Quando a égua vai permitir a monta do garanhão. A época das jabuticabas madurarem. E quando a chuva irá cair.

Faz-me falta a lida diária. Não me permito ficar em casa. Mesmo nestes tempos de isolamento.

E da mesma maneira me faz falta escrever a cada manhã. Botar pra fora a inspiração que me sufoca.

Sinto tanto a falta dos meus pais. Não consigo me libertar do passado. Ele me atrai com a abelha ao mel.

Faz-me tanto a falta dos amigos que se foram. E como gostaria, de por um minuto apenas, voltar a revê-los de novo. E relembrarmos juntos tudo que o passado sepultou. E deixou rastros de pura saudade. Em meu coração entronizado de amor.

Faz-me ainda falta aquelas férias de fim de ano. Quando passava um mês inteirinho na fazenda de um tio. Onde meu pai nasceu.

Faz-me falta tantas coisas. Que, se me lembrasse de todas, passaria um tempo enorme enumerando-as.

Pena que a vida passa. Tão depressa. Que quando percebemos já chegamos ao fim.

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