Coisas que não me apetecem

Já foi o tempo que gostava de tudo.

Coisas de criança.

Não via a hora de chegar o Natal. Não dormia de véspera.

Acordava ao nascer do sol, sem que meus pais percebessem, ia a sala desembrulhar os presentes, aqueles a mim destinados.

Ainda me lembro, anos avoam, de quando ganhei aquela linda bicicletinha de rodinhas amarelas.

Aprendi a me desvencilhar delas depois de muitos galos na testa. Foi meu pai que me ensinou a bicicletar por mim mesmo.

Os anos foram passando. E eu crescendo. Não muito. Diga-se de passagem. Quando me olhava no espelho, e media a minha altura, espichava os calcanhares tentando alongar-me a silhueta.

Foram debaldes as tentativas. Atingi a altura de um metro e setenta. A mesma do meu saudoso pai.

Com o passarinhar dos anos meus gostos e preferências foram mudando.

Descobri-me, assim que me fiz jovem, que as garotas me atraíam. E uma delas, a mais bonita, acabou sendo a dona do meu coração.

Foi no rela do jardim que a conheci. Eu pra lá. Ela no sentido contrário.

Olhares de puro deleite eram lançados de cada lado.  A seguir criei coragem e me declarei.

Quantos anos fazem? Perdi a conta. A partir de então passei a desdenhar dos números e passei a tomar gosto pelas palavras.

E elas continuam a fazer parte das minhas preferências. E com elas passei a formar frases. Que, anos mais tarde formaram textos. E hoje são dezoito livros a enfeitarem a estante atrás de onde escrevo. Pelos livros tenho o maior apreço.  Pelos números quase os desconheço.

Com o tempo se transformando em anos, com a idade avançando,  de outras coisas passei a desgostar.

Já agora, nesta altura da minha quase senilidade, ainda cônscio da minha capacidade, passei a desdenhar de tantos assuntos.

Entre eles a política. O futebol. Ouvir falar, quase todos os dias, no mesmo assunto: a tal pandemia que parece não ter fim, não faz meu gênero. Prefiro assistir a filmes pela televisão.

Ao final da tarde, depois de horas a fio durante o dia, lindo como o de hoje, ao chegar a casa, depois de malhar na academia, recosto ao leito, depois  de um banho morno, volto a assistir a filmes de ação.

Falar de política, de comentar sobre a tal virose maldita, quando vem alguém solicito que mude de assunto. O futebol, então, não faz a minha cabeça. Mudo de canal. E tento desviar meus pensamentos para assuntos mais amenos. Que tal falar de flores? Da natureza solenemente agredida? Dos animais, tão amistosos? Da doce infância perdida?

Nesta altura da minha sanidade não mais me apraz falar de assuntos tão comentados.

Ou escrevo sobre o cotidiano que me inebria. Ou viro as costas para a tal pandemia.

Certos  assuntos em absoluto não me atraem.

 

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