A lógica do Seu Mané

Não tem sido fácil conseguir emprego.

Principalmente nos dias de hoje. Nesta crise em que vivemos.

Uma multidão de desempregados perambula pelas ruas. Os bancos das praças nunca estiveram tão repletos de desocupados. As filas à porta dos bancos entopem as calçadas.

Uma legião de jovens, conhecidos como a geração Nem Nem, nem trabalham, nem estudam, vivem às costas dos pais. E não deixam a casa paterna por não terem o que fazer.

Idosos catam latinhas enquanto jovens passam dias a fio manuseando o celular.

A espera de quê. De a chuva cair. De a situação melhorar?

E enquanto a coisa não melhora estes mesmos jovens esperam o tempo passar.

E o tal tempo não espera. Passa, repassa, num compasso frenético. Quando se vê, não temos mais vinteanos. Quando olhamos pra trás não dá tempo de corrigir os desenganos.

Há tempos passo por ele.

Seu Mané, meu vizinho de roça, já passou em muito dos seus vinteanos. Se pudesse adivinhar sua idade, dobraria a minha, mais que da metade, somando-se dois, fazendo as contas, no ano passado ele completou oitenta e tantos anos.

E não parece.  Quem o vê, com olhos benevolentes, não lhe dá mais de quarenta.

Ele já se aposentou há anos passados.  E quem diria que aquele homem, com muitos anos nos costados, já deixou a enxada de lado. Tem pela foice uma devoção igual aquela que tinha pela sua esposa amada. Enviuvou há exatos dois anos. Agora vive solitário. Naquela casinha tosca. Herdada do patrão.

Teve cinco filhos. Que lhe deram seis netos. Agora espera a chegada do primeiro bis.

Os cinco filhos vivem às suas custas. Estão a espera de um emprego que nunca aparece.

Eles todos vivem numa casinha ao lado. São filhos cangurus.

Já passou da hora de conseguirem trabalho. Mas quem diz ser esta as suas intenções?

Todos eles, confortavelmente, comem à custa do pai. Vivem da sua aposentadoria.

Uma importância irrisória, que mal dá para a subsistência da família.

Por sorte deles Seu Mané nunca dependurou a enxada. Ainda faz bicos para aumentar a renda.

Nunca faltou comida naquele mesa ampla. E todos vivem de barriga cheia. À espera de a vida melhorar.

Naquele sábado, era final de tarde, quando passei por ele, encontrei-o prestes a se recolher. Já se fazia tarde embora ainda cedo.

Seu Mané se recolhia junto às galinhas e acordava ao cantar do galo. Tinha pelo trabalho verdadeira veneração.

Parei, junto dele, para um dedo de prosa. Estava uma secura de fazer seriema mudar de cor.

Uma poeira amarela encobria a vegetação ressequida do meio de setembro. Nada de chuva dar o ar de sua pessoa.

Falamos de tudo um pouco. Do tempo, da falta de emprego na cidade, da carestia dos alimentos. Do preço salgado da gasolina. Da corrupção que ambos abominamos.

Ele concordava com tudo que eu dizia.  Não dizia nada. Apenas fazia menção de estar de acordo comigo mesmo.

Quando lhe perguntei pelos filhos, se eles estavam trabalhando, naqueles dias difíceis, ele apenas me respondeu, quase monossilábico: “não, apenas me dão trabalho”.

Infelizmente a lógica do Seu Mané é a que tem prevalecido em nossos dias.

 

 

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