Mesmo assim persisto

Desistir nunca fez parte dos meus planos.

Em menino, novinho ainda, véspera do natal, desejando muito aquela bicicletinha de rodinhas amarelas. E ela não veio. Noutro ano não desisti.

Na cartinha mal escrita ao Papai Noel a ele quase supliquei: “meu bom velinho. Por favor, deixa debaixo daquele pinheirinho a tão sonhada bicicletinha”.  Mais uma vez ela não veio. Mas não desisti.

Noutros anos que se seguiram outras decepções vieram. Mais uma vez não ganhei a tão sonhada bicicleta. Até hoje desisti de pedalar. Uso as pernas no lugar de rodas. Creio que até meus últimos dias aqui na terra a tal bicicleta não vai chegar.

Já agora, ancião em descrédito no bom velhinho. Acredito que tudo não passou de um sonho bom. Nos dias de agora sou eu o bom velhinho. Que ama presentear meus netinhos com um regalo qualquer.

Sempre fui persistente. Não desisto de meus intentos.

Quando não sabia nadar quase me afoguei nas águas rasas de uma piscina. Insisti em aprender. E hoje nado com um pato e não afundo como dantes. Sou um nadador contumaz. Consumido pelos exercícios. Na tentativa inglória de não envelhecer.

Persisto e não desisto. Embora não sonhe mais pesadelos não me atormentam. Durmo o necessário. E não acordo em sobressalto.

Meus pensamentos vagueiam. Felizmente a inspiração não me abandona.

Embora persista nos meus escritos não tenho a pretensão de me tornar um escritor consagrado. Só o futuro irá dizer. Já que no passado não me atrevia a escrever. E no presente escrevo além do necessário.

Sou persistente nos meus escritos. Até no presente momento acredito que mais de vinte mil textos aqui estão arquivados no meu computador. Se fosse editar livros com essa montanha de crônicas não saberia dizer quantos serão. Embora saiba que desovar tantos livros seria mais uma missão impossível mesmo assim continuo escrevendo.

Não tenho a pretensão de obter lucro com meus livros. Basta que leiam alguns deles. E digam que a leitura foi apreciada. E se disserem a favor que o façam enquanto eu estiver vivo e respirando. Já que depois de eu fechar os olhos não saberei quais foram as suas apreciações.

Mesmo assim persisto e continuo a tentar. Um dia quem sabe serei reconhecido como descritor do cotidiano. Ou até mesmo um memorialista que não perdeu a memória.

Fatos pretéritos me atraem e não me atraiçoam. Embora saiba que vivemos no presente não me canso de cultuar o passado. Indiferente ao que o futuro prediz.

Persigo meus objetivos com um cão vai atrás daquela bolinha atirada por seu dono.

Atiro-me por inteiro. De corpo e alma no que desejo e quero.

Embora sabendo que vender livros seja uma tarefa quase inalcançável não me canso de publicar livros.

Sou persistente na minha arte. Escrever pra mim se tornou uma terapia. Bem melhor que pagar uma consulta ao psiquiatra.

Tenho pelas letras em alta estima. Pelas palavras nutro amor sem igual.

E quando palavras formam frases? E sobrevém parágrafos?

E quando uma crônica exala seu último suspiro?

Ai sim. Creio ter atingido meu maior objetivo.

Ao final de um escrito sinto por dentro uma sensação indefinível.

É como se ganhasse de presente aquela bicicletinha de rodinhas amarelas. A mesma que não ganhei num natal passado.

 

 

 

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