Acostumei-me

Hábitos, manias, costumes, fazem-nos parte da vida desde quando passamos a entendê-la como seres pensantes.

Quase impossível mudar a rotina. Temo-la como modus vivendis desde quando o quando nos faz pensar mais adiante.

Acostumamo-nos a gostar das pessoas desde que elas pensem da mesma forma que a gente. Caso alguma diferença entre elas e nós exista passamos a desgostar daquele amigo. Embora as boas amizades sejam fundamentais ao nosso viver desde sempre.

Acostumei-me a acordar sempre a mesma hora. Antes da seis já pulo da cama. Faça frio ou o calor predomine. Não importa a temperatura.

Daí me levanto. Passo uma água fria na cara. Penteio o que restou dos meus cabelos brancos. Tintos pelos anos.

A seguir visto a roupa dependurada no cabide. É a mesma de ontem. Deixo meu apartamento num átimo. Desço pelas escadas. E num instante estou aqui. Sempre a mesma hora. Quando o prédio se mostra vazio.

Acostumei-me a agir assim. Desde muitos anos atrás. E não pretendo mudar meus hábitos. Sou assim. De papel passado. Registrado no cartório desde quando nasci.

Acostumei-me a pensar muito na vida. E como ela se mostra distinta de quando fui jovem ainda. Os tempos mudaram. Ou teria mudado eu?

Hoje estamos atravessando um período complicado. A tal pandemia tem tirado o que restou do meu sono. Aliás, sempre me acostumei a dormir pouco. Considero a noite uma perda de tempo.

Não me acostumo a acordar depois das seis horas. A manhã, com o sol que brilha lá fora, é a melhor hora do dia para extravasar nossos pensamentos. Eles avoam como papéis ao vento.

Acostumei-me a escrever antes das sete. Assim que ligo o computador, tomo meu cafezinho magro, aqui estou. Observo meus peixinhos nadando feericamente. O que seria deles sem o meu aquário de águas borbulhantes? Creio que iriam morrer. Peixe fora d’água é o mesmo que deixar-me sem a inspiração que me domina.

Não me acostumo a agir de outra maneira. Talvez não me sinta a vontade. Acordando outra hora. Fazendo não o que tenho feito.

Acostumei-me a correr ao final da tarde. Agora, quando as academias estão de portas fechadas, atrevo-me a correr pelas ruas.

Durmo ao empoleirar das galinhas. Deixo o meu consultório sempre a mesma hora. Antes das quatro. Lastimo-me à mercê da crise que nos domina.

Não me acostumo aos novos hábitos. Bem sei da importância de usar máscaras. Do isolamento que nos tem recomendado.

Acostumei-me a caminhar pelas ruas. Distribuir bons dias a esmo. Não me acostumo a sonegar abraços. Nada como cumprimentar as pessoas. Mesmo aqueles desconhecidos.

Acostumei-me a não evitar apertos de mãos. Agora qualquer contato mais intimo deve ser evitado.

Não me acostumo, jamais, a ficar trancado dentro de casa. Num dia lindo como este, com o céu azul, sol a pino, como evitar ter de deixar o ninho. Pássaros, gente, como eu, foram feitas para avoar. E não me acostumo jamais ter minhas asas cortadas. Impedido de divagar sobre a vida.

É o que tenho me acostumado a fazer. Desde quando entendo que a vida deve ser vivida em sua plenitude máxima.

Acostumei-me a sentir a brisa fresca das madrugadas. Ou até mesmo o brilho do sol que incendeia minhalma.

Deixe uma resposta