Já passei da idade…

Amanhã, sete de dezembro, estarei um ano mais longevo.

Em absoluto não sinto o tempo passar. A cada ano que passa me rejuvenesço.

Não mais tenho vinte anos. Os trinta se foram no ralo do tempo. Ai que saudades da minha infância perdida. Que os anos não trazem mais…

Se pudesse, com a experiência adquirida, voltar aos vinte anos, não sei o que faria. Talvez permanecesse na idade em que estou. Já que nada sinto. As doenças ainda não conseguiram se interpor entre mim e aqueles verdes anos. Só que não tenho como contestar que os anos chegaram. O espelho me diz, como sua cara enxerida: “veja suas rugas espalhadas pelo canto dos olhos. Seus cabelos embranqueceram. O que restou deles, pelo menos. Você não é mais aquele jovenzinho que cortejava as mocinhas no rela do jardim. Suas ex-namoradinhas ou já não mais estão neste mundo ou se tornaram avós. Vê se te enxerga. Usa óculos que sua vista já se cansou”. E eu não ouso retrucar às suas admoestações. Umas, eu aceito. Embora não tenha mais o costume de me olhar no espelho. Faço de conta que estou como era dantes. Só que a barriga teima em dizer o contrário.

Já passei da idade. Agora me encontro na melhor idade. Faço apenas o que me apraz. O que contraria as minhas vontades finjo não estou nem aí. Muito menos acolá.

Já ultrapassei a idade de me fazer de desentendido. Meus ouvidos filtram o que dizem por aí.

Já passei da idade de me apoquentar com a chuva que cai. Ela faz falta. Se me molho, não faço questão de me enxugar. O que são algumas gotinhas de água caindo sobre meus cabelos despenteados? Tenho sim receio do sol em desvario. Ele sim. Pode queimar a minha calva luzidia.

Já passei do tempo de fazer questão de qualquer coisa. Se tudo vai mal? Espero melhorar.

Já passei do tempo de me chatear com o que dizem por aí. Falem mal. Mas falem qualquer coisa sobre mim.

Caso tenha desafetos procuro distribuir afetos mesmo aos desconhecidos. Como faz bem distribuir bons dias pelas ruas. Mesmo se aquele dia não for tanto.

Já passei do tempo de colecionar desafetos. Gentileza atrai bons fluidos. Um sorriso vale mais que uma carranca obtusa.

Já ultrapassei o tempo de não fazer amigos. Espero continuar assim pelo resto dos anos que me restam.

Tenho alguns poucos anos pela frente. Não vale a pena continuar a curtir desenganos.

Já passei da idade de contar anos. Não faço mais aniversários. Desaniversario a cada ano que passa.

Ainda me sinto jovem. Não ligo para o que diz o espelho abelhudo. Já passei da idade de ter vaidades. Uso a roupa primeira que sai do armário. Apenas lavo o rosto. Não cuido tanto da aparência. Procuro apenas aparentar sempre o melhor humor que me consome.

Já passei do tempo de pensar tanto no amanhã. Já conquistei quase tudo que sonhava. Ainda sonho. Mesmo de olhos abertos.

Só não passei do tempo de continuar vivendo. De ter esperanças num amanhã melhor para os meus netinhos.

Já passei do tempo de tantas coisas. Procuro apenas pensar que tudo que passou tenha valido a pena.

Jamais abdiquei dos sonhos. Mesmo celebrando, no dia de amanhã, meus setenta e dois anos…

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