Mesmo que…

Mesmo, palavrinha de múltiplos sentidos. Diz o dicionário que ela quer dizer tantas coisas – exatamente igual, idêntico, não outro, semelhante, e outros sentidos mais, hoje, nove de março, não sei por qual razão acordei mais tarde que o usual.

Acordei meio apressado. Olhei para a esquerda e identifiquei, pelo celular, que já passava das seis horas da manhã. Pra eu dizer que acordei exatamente as seis pode alguém pensar que acordei tempranamente. Mal sabem eles que pra mim seis da manhã já passou da hora de saltar da cama, não para assaltar a geladeira. Pois não tenho este costume. Via de sempre me levanto antes das cinco horas. Vou primeiro a cozinha. Não para cozinhar ovos ou tomar um cafezinho magro acompanhado de um pão requentado na trempe do fogão a lenha. Pois, mesmo que tivesse o tal fogão. Que o costume era tê-lo nas roças. Pois lá lenhas abundam como abundam as bundas de fora durante as piscinadas e o passado carnaval. Não tenho, desde priscas eras. De comer no café matinal pão amanteigado. E sim ingiro duas bananas misturadas a Maltodextrina. Meio liquidificador de leite gelado. Misturo essa mistureba na mesma batedeira. Tomo em goladas várias até esvaziar o copo. Num átimo estou no consultório. Aqui, onde me encontro agora. Em primeiro lugar ponho a trabalhar meus dois computadores. Esse onde escrevo crônicas e o segundo defronte a mim onde romances são romanceados. Nesse instante Rakel já está já na sua metade. E, no momento exato que termino a crônica pulo à mesa do lado e reinicio a minha história cujo título é intitulado Rakel. E como me sinto absurdamente absorto naqueles seis personagens protagonistas principais desse romance pra mim notável e instigante. Cujos nomes são: Rakel, Ângela, Fritz, Manuela, Tom Zé e seu amiguinho que se descobriu gay, por mim denominado Yansé. Os dois últimos são Yanomamis. Cenário onde se passa a trama. Tendo como panos de fundos a Amazônia e suas maravilhas tão judiadas pelas mãos destruidoras dos humanos. A vizinha Guiana Francesa, a bela ilha de Marajó. E, agora mesmo a trama se desenrola na Venezuela. Numa cidadezinha fronteiriça ao estado de Roraima de nome Santa Helena do Uairén.

Lugares nunca dantes visitados, mas por mim imaginados. Pois dentro de meu cérebro amalucado neurônios batem cabecinhas e não param de funcionar nem para dormir.

Mesmo que esse romance, o de número seis de minha coleção, não chegue ao desfecho, espero que não. Quem sabe alguém. De mente fértil como a minha. Continue a escrevê-lo em linhas retas e não tortuosas. E não pare antes de seu ponto final. Não cometa a imprudência de deixá-lo inacabado como aquela linda igreja em Barcelona de autoria de um arquiteto catalão de nome Gaudi. O maior símbolo daquela linda cidade cujo nome é Sagrada Familia. Nunca vi um nome tão adequado pois nada mais sacrossanta que a tal família. Embora em seu seio muitos aparentados não se biquem. Mesmo assim não me desprendo da minha jamais. Mesmo que, a chuva não pare. E o sol continue dorminhoco. Não fico no leito mais que o bastante.

Mesmo que a minha imaginação não funcione, como nos dias de agora. Quem sabe algum tresloucado cientista faça em mim um transplante de cérebro. Por favor, eu lhes suplico: não deixem que o doador seja um tal político barbudo nosso atual presidente. Caso eu tenha a desventura de ter o cérebro de minhoca dele implantado dentro do meu eu quem saberia dizer que euzinho teria a coragem de me casar, pela segunda vez, com a doidivanas de uma tal de Janja. Já que eu prefiro a dona das jóias doadas numa visita do ex presidente à Arábia. Aquela lindona da dona Michele. Ah, se por acaso de um descaso ela for candidata ao governo do estado onde se situa a nossa capital Brasília. Vou tratar de transferir logo meu título de eleitor pra lá. Assim me livro de ter de dar meu voto cá. Onde moro e na cidade que adoro. Onde gostaria que fossem depositados ou incinerados meus restos mortais. Se por acaso de um descaso eu tiver de morrer. Já disse e não me canso de repetir: se pudesse escolher a data do meu passamento seria num dia trinta e um de fevereiro. E, no meu testamento, feito de próprio punhal (perdoem-me por ter escrito punhal quando deveras deveria ser punho). Deixarei grafado, em letras de forma: “não ponham flores no meu caixão. Lotem-no de livros meus. Não deixem meu sorriso mortal a descoberto. E não permitam jamais que falsas lágrimas despenquem naquela hora trágica pra muitos. No entanto alegres para mim defunto”.

Mesmo que eu pare de escrever tanto. Aí sim me pranteiem. E digam, lacrimejantes: “como ele era um perfeito retratista do cotidiano e ótimo memorialista. Podem perfeitamente acrescentar romancista. Ou palrador dizendo ser fluente, não influente, em seis idiomas. Não é fake e sim uma mentirinha pequenina. Como o nosso amor nasceu.

Mesmo que digam que eu sou. Ou fui, num passado dinossáurico, um bom especialista em urologia não digam jamais que meu dedo indicador era grande ou grosso demais. Elezinho é fino e macio. E, prometo e me comprometo a não mais perguntar: “quantos anus o senhor tem? Na intenção de fazer da cabeça do inquirido um emaranhado confuso. Quando, deveras, a minha intenção era saber qual a idade do perguntado”.

Mesmo que falte eletricidade agora, neste prédio das clínicas, e eu fique no escuro. Não permitam nunca que meu texto de hoje cedo não se perca entre meus mais de dez mil desde aquela noite triste. Do ano dois mil. Quando, talvez, quem sabe, psicografado por meu pai deixei escrita a minha primeira das muitas crônicas – Réquiem a um pai sem limites.

Mesmo que, eu perca a minha inspiração. Não permitam jamais que isso aconteça. Que eu continue sempre assim como eu tento ser.

Espalhando cultura e livros por onde eu passar. Sempre andando pelas próprias pernas andarilhas.

E, se, um dia for privado de escrever, por rigidez de meus dez dedos. E minha inspiração não se perca. Que façam como fizeram com aquele maestro pianista que continua a reger e pianar. Mais um neologismo Rodarteano. O correto seria tocar piano. Inventem uma luva robótica que me permita novamente digitar as teclas negras de letras brancas desse meu computador que pede pra descansar de tão velho que está e eu não permito trocá-lo por um novinho em folha.

Mesmo que, enfim, eu não mais sonhar. Por favor, me alijem de mim. Antes que meu corpo morra e meu cérebro volte a pensar na cabeça de algures. E que este receptor de meu cérebro tenha a mesma sensibilidade que tive a graça de ter desenvolvido. Ou até mesmo nascido. Não naquela casa que não mais existe. Que daqui se avista pelos fundos reduzidos a um lote vazio. Tapado por um tapume metálico.

Mesmo que, ou porque dos muitos porqueres que me instigam tanto…

 

 

 

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