Até quando???

Quase aos setenta anos, faltando apenas alguns dias, indago: “até quando estarei por aqui”?

Acordando neste dia tão lindo. Céu azul, sol a brilhar, temperatura amena de primavera, no decorrer do dia deve esquentar.

Até quando, esta interrogação me alucina, poderei caminhar pelas próprias pernas, sem a ajuda de outrem, nesta caminhada até agora sem percalços, com a saúde ainda a me bafejar como o vento que neste exato momento não assopra, quem sabe quando irei me despedir do mundo, este mundo tão díspare, onde tantos têm tudo, ao revés do que acontece a maioria?

Este final de semana foi dedicado aos mortos. Dia dois fui ao campo santo. Ali pranteei meus pais. Depositei flores sobre aquela lápide cinzenta. As flores murcharam. Como nossos corpos um dia murcharão.

Até quando, por vezes questiono, poderei acordar cedo, caminhar ao meu consultório, retratar o cotidiano, exercer esta profissão que até hoje me encanta, até um dia quando meu tirocínio não se tornar tão claro, meus dedos não forem capazes de digitar com tal velocidade, minhas pernas fraquejarem, e meu coração parar de bater. Para tudo isso ainda não tenho a resposta. E não a procuro.

Até quando, me pergunto, poderei amparar meus netos, acompanhar-lhes a trajetória, ir com eles a escola, até se tornarem pessoas felizes como eu tento ser.

Até quando, mais uma vez indago, poderei me exercitar ao cair das tardes, naquela academia que me faz tão bem?

As penas ainda as tenho fortes o bastante para me levarem aonde desejo. O fôlego se mostra em dia. A visão não carece de óculos para escrever o que minha inspiração dita.

Mas até quando?

Amanhã, depois de outro amanhã, estarei setentando. Novembro ainda está começando. Mais um ano logo termina.

E até quando poderei conviver com amigos. Já que tantos não mais estão ao meu lado. E já partiram rumo ao infinito.

Quantos até quando fazem parte de minhas indefinições.

E eles ainda estarão presentes. Até quando me despedir da vida. Vida esta que em contrapartida desejo que faça parte de mim desde que tenha saúde suficiente para pensar com clarividência. Fazer apenas o que me apraz. E consiga viver em paz comigo mesmo.

Até quando, por fim me questiono, estarei apto a exercer a medicina, esta ciência tão especial, embora tentem tirar dela o brilho.

Até quando, neste quatro de novembro, dia lindo, quente, sol a pino, poderei abraçar meus meninos, hoje são três. Amanhã estarão bem maiores que seu avô.

Até no presente momento me sinto a vontade. E ainda tenho desejos de viver muitos anos mais. Desde que a saúde não me abandone. A inspiração não claudique. O amor que sinto pela vida não se transforme em mais uma desesperança que meus sonhos não se concretizem.

Sonhar ainda sonho. Até quando? Nem mais sei.

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