Hoje meus valores mudaram

Não me esqueço daquele dia.

Era ainda cedo quando deixei a casa dos meus netinhos.

Theo contava com quatro aninhos. Dom apenas dois.

Ofereci-lhes um prêmio caso um dos dois dissesse qual o valor daquela nota graúda que trazia na carteira. Era uma nota de cem reais.

Donzinho, mal sabendo falar, desenhou numa folha de papel o número cem. Theo logo depois disse num sorriso transparente: “vovô. Essa nota é de cem reais”.

No meu tempo acredito que nunca ganhei de presente nada que se equivalesse a esse valor tão alto. No máximo era presenteado com alguma coisa entre cinquenta e alguns trocados a mais. Uma moedinha de um real era algo inimaginável pra mim. Logo que aquela moedinha tilintava ao meu alcance logo a depositava num porquinho cofrinho. Que em pouco tempo feito em cacos. E com seu conteúdo ia à venda do Seu Manoel apressadinho a fim de pagar a conta que não somava tanto.

Naquela tarde noite foi o Dom, por ter adivinhando o valor daquela nota alta, que ficou com ela. Creio que elezinho até hoje guarda aquela importância num esconderijo que só ele sabe onde fica.  Às escondidas do seu irmãozinho o Theo. Que, nos dias de hoje, tem numa pasta uma quantia bem alta. Que ele não conta pra ninguém.

Meus valores, não monetários, mudaram ao saber dos anos.

Bem antes, ainda menino criança, cria num Papai Noel verdadeiro.

E que o bom velhinho chegava embarcado num lindo trenó de renas aladas. Vindo de um lugar bem frio. Chamado Lapônia. Só duvidava como um senhor de barbas nevadas. Gorducho e de mais idade. Conseguia entrar por uma chaminé estreitinha. E sabia de cor a qual garotinho deixar seu presente. Meus valores naqueles bons tempos não era saber qual o preço de nossos presentes. E sim que ele foi dado de bom grado por aquele velhinho chamado Papai Noel.

Os anos fogem ao nosso alcance. Não há como frear o movimento frenético dos ponteiros dos relógios.

Aos dez anos me foi dada uma nota de vinte reais. Era o valor total de minha mesada mensal. Com ela tinha de me virar. Comprar pirulitos feitos de mel e açúcar na venda logo na esquina da rua onde morava. Pagar a conta da padaria onde tomava meu café com leite. E com essa nota me exibia todo gabola aos colegas da minha rua. Era uma nota alta para os tempos de outrora. Dai o apelido que me deram- Riquinho.

Anos se foram. E eu com eles cresci. Não muito, mas um pouquinho o suficiente para não ser chamado baixinho.

Aos quase vinte aprendi outros valores. Não ligados a dinheiro.

Uma vez maior de idade aprendi a respeitar os de mais idade. Era um jovem respeitoso. Ainda sem saber o meu porvir.

Aos vinte e cinco. Já graduado em medicina, aprendi a valorizar quem sofria de dores. Embora já imaginasse que a dor era inevitável e o sofrimento opcional.

Naquela idade, ainda jovem, aprendi a dar valor à vida dos meus pacientes. E me impacientava muito ao vê-los sofrer.

Já aos mais de trinta outros valores passei a cultivar. De casamento marcado. De papel passado com uma mulher guerreira me consorciei.

Desse consórcio vieram os filhos. Que incorporaram outros valores a minha vida.

Um valor bem maior que se chama família. Que não se mesura em cifras e sim em amor que sentimos por ela.

Mais anos se multiplicam aos que tenho vivido. A idade agora me cavalga aos costados.

Meus valores continuam mudando. Enquanto mudo de roupa meus valores se transformam em sonhos.

Não sonho tanto mais. Contento-me em sonhar menos.

Tenho outros valores. Não conto notas como um dia Theo, espertinho, contava suas notas guardadas num esconderijo que só ele sabe onde é.

Também não vivo a contar anos que me restam. Nem ao menos conto vantagens do que tenho feito.

Simplesmente dou valor aqueles que de fato tenham valor. Não valorizo ídolos falsos.

 

 

 

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