Não sei o que vai ser de mim

Quando a gente nasce desconhecemos  o nosso porvir.

Ainda bem que é assim. Desconhecer o que vem por ai por certo é uma ventura.

A incerteza é um bem por demais precioso. Saber ao certo qual seria o nosso destino talvez seja pior do que se imagina. Melhor ficarmos na dúvida. Pois o futuro a Deus pertence. O presente pra mim acontece no dia de hoje. O passado se torna mais e mais distante dos anos que nos são dados. E o amanhã pra mim se torna indiferente. Já que vivo o dia de agora. Sem sequer saber o vai ser no dia seguinte. Na idade em que me encontro me contento em saber apenas e tão somente que já vivi o bastante e pretendo viver com saúde alguns anos mais.

Não sabia o que iria ser de mim quando ainda criança.  Gostaria sim de crescer. Quem sabe chegar à altura do meu pai. Ultrapassar a de minha mãe. Mas apenas alcancei em altura alguns metros a mais de sessenta. Chegando aos setenta. Creio que estou encolhendo.  Não sei há quantos metros irei chegar. Não importa de verdade. Já dizia um velho mestre: “a verdadeira altura de um homem se mede do alto das sobrancelhas a onde começam os cabelos.”

Ele se referia à inteligência. O tamanho da caixa pensante é o que conta.

Não sei o que seria de mim sem os amigos. Verdadeiras amizades as tenho aqui dentro do meu coração.

Da mesma maneira ignoro o que seria se mim sem meus pais.  Nem existiria. Não estaria aqui a viver esses tantos anos.

Não saberia dizer o que seria de mim sem esse dom de escrever tanto. Não iria querer viver tantos anos mais. Acordar tão cedo. Chegar aqui na minha oficina de trabalho. Olhar da janela parte do meu passado. E me inspirar em quase tudo. Olhar os peixinhos do meu aquário nadarem em cardume. Os vermelhinhos juntinhos. Os acarás em pares. Numa revoada frenética como se fossem pássaros em meio liquido.

Não saberia dizer que seria de mim sem o costume de me exercitar tanto. No meu caminhar constante. Nesses meus setenta e cinco sem quase não precisar da ajuda de um colega por me sentir enfermo.

Não sei o que seria de mim sem o apoio da minha família. Da minha parceira de tantos anos que atura meus hábitos um tanto esdrúxulos. Eu acordo durante as madrugadas. Deixo meu apartamento a mesma hora costumeira. E ela não reclama e continua na cama.

Não sei o que seria de mim sem a medicina que até hoje me acompanha. Ainda tenho por ela o maior chamego. Se um dia a deixar de lado não seria tão feliz como me sinto agora. Aposentar-me por completo não iria caber dentro de mim. Seria como um velho sapato deixado de lado pelo dono. Sem chance nenhuma de ser remendado ou receber meia sola.

Não saberia dizer o que seria de mim sem esse convívio amistoso com as pessoas com quem me cruzo pelas ruas. Da mesma maneira que não sei viver sem amigos não me sinto solitário  na solidão que não me incomoda.

Não sei que seria de mim sem poder enxergar a luz do sol que agora ofusca a minha retina. Meus olhos são dotados da mesma sensibilidade minha.

Não sei o que vai ser de mim de agora a outra hora. Sei só que aqui estarei ate as dez da manhã.  Retorno as treze e saio lá pelas quinze. Estico os dias na medida certa para deixar a noite com saudades.

Não sei o que seria de mim sem leitores dos meus escritos. Escrevo para ser lido. Um comentário me é tão valioso quanto o abraço de um amigo.

Não sei o que seria de minha pessoa sem meus queridos netinhos. Junto deles me rejuvenesço. Sinto-me como se voltasse a minha infância. Aos meus poucos aninhos.

Não sei o que seria de mim sem presenciar filhotes de passarinhos deixando o ninho pela primeira vez. Eles me fazem lembrar de mim mesmo quando deixei a casa dos meus pais rumo a velha BH, na intenção de me preparar para o vestibular de medicina.

Não sei ainda o que vai ser de mim ao final desse texto. Sei sim que amanhã irei escrever outro. E outros mais no tempo que me resta de vida até o final dos meus dias.

 

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