O agregador de amigos

Desde que passei a entender da vida tenho pensado em angariar boas amizades.

Nos primeiros anos mal sabia quais seriam os bons amigos.

E ainda morava naquela velha casa. Naquela rua. Chamada Costa Pereira. Fronteiriça ao Hospital Vaz Monteiro e ao clube chamado por Lavras Tênis Clube.

Hoje a Costa Pereira, onde moravam os Rodartes, resta apenas um deles.

O primo Luiz Carlos, tabelião, o qual considero não só primo, como um agregador de amigos.

Ali morava com seu pai. Tio Rui. Como sua esposa amada. Tia Dodó. A Dorinha, nascida no Pinheirinho, agora chamado de Ingaí. E seu irmão amado. O primo Pedro. Que infelizmente foi chamado a exercer a odontologia ao lado de Deus pai e seus cuidadores os anjinhos. Por onde passava, quase todos os dias, egresso do posto da Chacrinha. Subindo por aquela rua, sinuosa, onde filava meia boia.  Pois morava um cadinho longe. No belo condomínio Jardim das Palmeiras.

Mais acima. Ombro a ombro com a caixa d’água, que agora resiste bravamente ao tempo.

Descendo a mesma Costa Pereira, no prédio construído, aos trancos e barrancos, pelo meu pai Paulo José de Abreu, era a casa do meu avô Rodartino Rodarte. Foi com ele que aprendi o significado de Rodarte. Não fui quem criei tal sobre. Ele veio de uma estaçãozinha. Hoje sepultada pela represa do Funil. Pertinho de minha roça. Na estação chamada de Vigilato.

Contaram-me. Já que não estava presente naqueles anos doirados. A tal estação era nas barbas de onde meu colega Odilon. Hábil cuidador de corações, quase da minha idade. Ainda possui uma fazenda produtora de café. Logo às margens do lago do Funil. Onde, tempos passados, meu avozinho querido, radioamador pioneiro em nossa comunidade. Tinha uma fabriqueta de queijos e manteiga. Uma lata velhusca dizia que a tal manteiga de pura gordura de leite levava o nome de Rute. Minha saudosa mãezinha foi batizada de Rute.

Voltando ao sobrenome Rodarte, na minha concepção dava no mesmo que rodar com arte.

Pois, desde que passei a entender das coisas e loisas. Tanto meu avô Rodartino tinha como predileção andar por meia cidade. Com aquele terninho azul, com riscas de giz. Com a sua sandália de couro marrom. Toda surrada. Usando um suspensório que não combinava com sua camisa da cor de burro fugido. Pois vaidade era uma virtude que não fazia parte de sua índole simplesinha.

Ele sim. Era um agregador de amigos.   Não um esvaziador de bancos. Como os malas, os chatos, eram conhecidos.

Descendo pela mesma Costa Pereira, hoje transformada em rua das Clinicas. Ainda fazendo referência aos de sobrenome Rodarte. Uma casa abaixo de onde morou Paulo Reis. Naquela casa agora demolida. Vedada a sua vista por um tapume que não só nos impede de a gente voltar ao passado. Como pra mim, não nascido naquela mesma morada. E sim lá passei mais da metade de minha existência. Considero a Costa Pereira não apenas onde cresci. Tenho-a como berço de verdade.

Logo, parede a parede, com a casa de número 152, seguia-lhe outra. A do meu não menos amado Tio Chico Rodarte.

Hábil causídico. Notável orador.

Aquele mesmo senhor, semi nu, com uma toalhinha que mal lhe cobria o decoro, lendo jornal, egresso da sauna, de repente acabou afundando naquela piscina de águas frígidas e profundas.   Ah, se não fosse um heroico salva vidas que o salvou da morte certa.  Ignoro qual seria o futuro do meu incipiente revisor.

Não sei se me consideram um agregador de amigos. E, em contrapartida um esvaziador de bancos.

Nunca foi de meu costume ficar nos bancos das praças junto a amigos.

Pois, pra mim, o tempo ainda é exíguo.

Espero, antes que as doenças se aboletem em mim, poder observar, seja de pé, ou conferindo minhas nádegas ao assento. Passar horas vazias escutando o debruçar das flores dos ipês despencando da ponta dos galhos. Ainda lindas e respirando.

0u até mesmo agregar amigos. Jogando conversa fora. Ou fofocando sandices sobre a vida de outrem.

Esse cidadão a quem admiro, de montão, é, de fato um agregador de amigos.

E como ele os possui às dezenas.

Milhares. Diria eu.

Ele tem a cabeça branquinha como neve da montanha. É figura notabilíssima não só na Praça Augusto Silva como nos arrabaldes.

Hábil prosador. Daí como ele é conhecido: como Fernando Prosinha.

Escritor fecundo. Dono de uma simpatia que extravasa pelos cotovelos ossudos.

Sempre o vejo caminhando. A exemplo do meu avô Rodartino.

Ou, de pé, rodeado de amigos. Pois ele, não o considero um esvaziador de bancos. E sim um sujeito respeitado não só por aqueles que o conhecem como pelos desconhecidos.

Ainda me lembro de um lançamento de um dos meus livros.

Fernandinho Prosinha boa ali compareceu. Veio de taxi até apear no clube do condomínio Jardim das Palmeiras.

E pouco tempo ali permaneceu.

E ele partiu cedo. Só depois de adquirir este livro de minha lavra. Não me lembro qual dos dezenove foi.

Na manhã seguinte procurei-o no seu apartamento. Foi chumbo trocado. Comprei aquele seu livro. Que retrata em letras vibrantes parte da sua história. Que narra com maestria o que sempre retratou. Como comentarista esportivo. Em toda a sua trajetória pelo mundo dos esportes.

Ontem fizemos um selfie juntos. Foi na mesma praça. No mesmo banco. Do mesmo jardim.

Fernandinho Prosinha é um verdadeiro agregador de amigos.

E espero ainda, nos anos que me restam, não apenas conservar intacta a nossa amizade. E sim passar um tempo enorme. Assentado àquele banco, de seu costume, a ouvir os seus causos. Até que os anjos digam amém.

 

 

 

 

 

 

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