Toninho e o pastel de vento

Vento. Definido como um assopro que vem do alto, também chamado de ventania, quando passa dos limites e se torna demasiadamente forte, espalha folhas assentadas depois de despejadas de suas  arvores mães, dando um trabalhão danado aos encarregados da limpeza pública, mas que tem uma virtude inconteste de quando esse mesmo ventinho camarada passa por debaixo das saias rodadas das mocinhas lindas de ancas largas, e, se caso elas não usam por baixo daquele pedaço econômico de pano algo semelhante ao que se usava nos tempos idos – anáguas, espartilhos e combinações. E se esquecem de usar calcinhas minúsculas esse mesmo assopro movido por um pulmão forte o bastante para nos  permitir ver qual a cor daquela calcinha ou a falta dela algo escondidinho que dantes era tido como pecado mas hoje não mais.

Mas ventania de fato incomoda por vezes. Durante uma aguerrida partida de tênis, assistida ontem em plena quadra central de Roland Garros, um dos jogadores, ao dar um saque forte cheio de slice, a bolinha amarelinha voou até o último degrau das arquibancadas, lá em cima, e acabou entupindo o grito da torcedora pois ela engoliu a bola e pra sair deu um trabalho enorme ao colega proctologista.

Mesmo assim o tal vento não foi invento de nenhum mortal. Ele é mais um fenômeno meteorológico muito frequente em todas as partes principalmente em locais descampados ao ar livre e com que alegria a gente, uma vez com a barriga estufada cheia de gases soltamos um sonoro “pum”.

Mas o que tem o vento com o menino artioso Toninho?

Ele sempre, desde quando o conheço, foi metido a engraçadinho. Fazia piadas até com a desdita alheia.

Ria até da sua pobre avozinha quando ela, já gagá, fazia uma confusão danada entre seu gato siamês e seu marido que já fora um gato na tenra idade. E chamava o gato de Seu João quando  o nome do gato era Branquinho e do seu esposo velho e surdo era de fato Seu João.

Mas na escola Toninho até que era um aluno razoavelmente bom. Era tido como um alcagueta das coisas e loisas as quais espalhava como vento na ventania.

E quando o assunto dizia respeito as suas malandragens ele permanecia numa mudez de porteira fechada.

Mesmo assim, com todos os defeitos e virtudes, Toninho tinha um futuro promissor.

Era tão bom em português e fazia igual em matemática.

Nas línguas mais difíceis, como o latim e o mandarim, se virava até que muito bem.

Mas na hora do recreio fazia cada uma de dar torcicolo na gente quando por detrás aparece, do nada, uma linda mulher com o traseiro a rebolar.

E, nas vizinhanças da escola estadual, um sujeito mais engraçado e cheio de gentilezas e graças com a sua freguesia era ele e sua patroa quem fazia os deliciosos pasteis tanto de queijo, de carne não se sabe a procedência, e de uma mistura esquisita dita de frango e palmito.

E era para aquela casa de pasteis variados que a turma amiga de Toninho ia tomar lanche na hora da folga do recreio. Quase hora inteira de piadas e brincadeiras que se calavam assim que a aula tinha início.

E o pastel que Toninho, pelo seu preço mais em conta, e devido ao seu recheio que mostrava queijo de boa qualidade derramando-se pelas bordas, era o de queijo fresco.

A turma amistosa, e ao mesmo tempo jocosa, amigos de todas as horas, animadamente comparecia pontualmente antes das dez da manhã, à pastelaria do casal oriundos de nossa vizinha Oliveira.

O primeiro a pedir o pastel  era sempre Toninho: “ o meu é de queijo viu! E não o de vento como vocês costumam fazer”.

E, assim que o pastel chegava da fritadeira quentinho feito na hora, à primeira mordida do rapazola engraçadinho de dentro dele em verdade saía um ventinho. E o queijo ficava na parte mais funda do pastel. E um queijo derretido escorria pelo canto da boca do jocoso Toninho.

Naquela manhã do dia de ontem. Era uma segunda feira quase meio de junho. Eu estava presente na pastelaria no momento exato que a turma do Toninho chegou rindo a cotovelos dobrados.

Toninho, como de hábito, foi o primeiro a abrir a boca e soltar lá de dentro: “ quero meu pastel de queijo viu! Não de vento”.

O dono da pastelaria, naquela hora de muito movimento, com o seu estabelecimento cheio de fregueses, num átimo de segundos, já que a fritadeira estava com o óleo escaldante, de dentro daquela baciona tirou o primeiro pastel.

Toninho, à primeira dentada olhou pra dentro do pastel fumegante, e, depois de o vento ser expelido, nada restava no interior do pastel. Que deveria conter queijo derretido.

Era de fato um pastel recheado de vento. Um ventinho quentinho que fez-me rir em seguida.

E, para completar a minha felicidade, ao  ver o sorriso de lagarto do dono da pastelaria, ele mesmo serviu ao engraçadinho Toninho um pastel deveras cheio de queijo quente. De um sabor inconfundivelmente delicioso.

Desde ontem não me esqueço da peça que o pasteleiro de Oliveira pregou a mim mesmo. E eu não me chamo Toninho o engraçadinho.

 

 

 

 

 

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