Lá o sol brilha mais

Nada contra a chuva. Ela é bem vinda sobretudo na roça.

Em festas de grã-finagens, quando o tempo se acinzenta, é um Deus nos acuda.

É um tal de levar as cadeiras para um canto coberto. É gente humilde, funcionários, muitas vezes sem carteira assinada. Correndo de um lado pro outro. Apalermados. Tentando salvar o rega bofe. Ao revés correm o risco de serem mandados pro olho da rua. À espera do tal auxilio do governo. Que ainda está sendo discutido de quanto seria. No ano próximo. Sob a égide de um novo presidente. Que não é novidade nenhuma. É cara mais do que manjada por ter recebido propinas que concorreram para a falência da Petrobras. E pena que o desemprego ainda viceja como ervas daninhas num canteiro de margarida ou petúnias coloridas.

Como disse nada tenho contra chuvas. Mas ela quando vem em saraivadas tempestuosas pode levar ao desabrigo gente que não tem teto onde morar. E vive como pode. E como lhes apraz.

Sempre, desde quando tinha cabelos aos montes, amava passar as férias de final ou meio de ano na rocinha de umas tias avós. Na zona rural de Perdões.

Era quase um mês inteirinho disputando aquela baciona na hora do banho da tarde.

Minhas queridas Mariana ou Leonor nos ensaboava da cabeça ao pirulito que não empinava tanto quanto na juventude.

E a hora da janta todos nós, aparentados por parte de minha amada mãe Rute.

Assentávamos no rabo do fogão a lenha ainda crepitante. A fim de saborear aquele arrozinho com feijão cosidos na hora. Juntinho vinha no prato uma deliciosa carne de suíno guardada na lata de banha desde o Natal passado.

E assim ficávamos um mês inteiro. E eu lacrimejava a hora de voltar à cidade. Esta minha Lavras que tanto amo.

Hoje fui convidado por um primo que sempre me foi muito caro desde há anos e anos atrás.

Ele hoje completa meia década. Negis cinquentou.

Ali, naquela casa magnifica, cheguei mais de uma bora antes da festa começar.

Estava vindo da minha rocinha a sete quilômetros de terra de Ijaci.

Lá é meu paraíso que nunca termina. Quando se pensa que ce finit recomeça na estaca zero. E um faz de conta que está pronto que nunca recebe o ponto final.

Aja grana! E grama.

A festa do primo Negis é uma efeméride assaz concorrida. E ele merece demais.

Só o bufê deve ter custado mais de mil éguas de pura marcha. A decoração das tendas montadas previamente nem nas mil e uma noites.

Isso sem saber o menu da janta. Que nesta hora deve ter começado.

Uma equipe de maitres e garçons paramentados me deu um rebuliço no estômago vazio.

E o pobre ressonava qual uma matilha de gatos persas.

E a chuvarada deu uma trégua. Parou de repente. Fez-se sol.

Depois de alguns chopinhos. Creio terem sido uns trinta. Mal podia aquietar-me a língua dentro da boca.

Aparecia um convidado e desaparecia outro.

E eu tinha de ainda passar na minha roça. Ainda bem que minha Oroch dava conta do recado. De mim não garanto nada.

A chuva serenou. Na viagem de volta cruzei-me com outros convivas chegando. E eu indo. E cada carrão com que cruzava que me causava espanto.

Antes de ver como foi a faxina de dona Laís ainda passei na casa velha do Tom Zé. E ele cochilava. Na sua cama de palha enfestada de ratazanas gordas.

Convidei-o para ir comigo. No que ele se negou veementemente.

Não insisti. Fui só.

Em lá chegando logo vi como estavam meus dois cãezinhos. A eles disse um sonoro e latido boa tarde.

E eles retribuíram latidamente – “au”.

Agora. De volta aonde estou. Mais uma vez solitário no meu sétimo andar. A escrever este texto.

O sol veio abrilhantar a minha janela. Meus peixinhos sorriam. E eu teclando estas teclas macias.

Nada contra a chuva. Desde que ela não seja em demasia.

E também não faço objeção ao sol. Desde que ele não queime a minha calva.

No entanto.  Comparando-se a festa maravilhosa que fui. Embora tenha sido pela metade.

Lá. Na festa linda do primo Negis. Embora a chuva tivesse cedido lugar ao sol.

Na minha roça. Entre Tom Zés. Zé Antonhos. Tiãozinhos dos Aristeus. Betãos, Binhos, e etcs.

Se me perguntarem onde me sinto melhor. A resposta a tenho na ponta da língua: “na roça, onde a singeleza domina. Onde os canarinhos da terra ciscam o esterco do curral. Onde a vaca muge de saudade de suas crias. Onde a seriema pernalta corre mais do que um carro.  Onde tudo me encanta. E quase não tenho desencantos. Não me pairam dúvidas. Na roça o sol brilha mais forte. É só olhar pro alto e comprovar”.

 

 

 

 

 

 

 

 

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