Tião Nem e Chico Também

Eram dois primos que não se desgrudavam.

Passavam o dia inteiro de papo pro ar. Trabalho nunca lhes passou pela cabeça. Acordavam cedo para ficar mais tempo à-toa.

Nascidos em famílias de classe média, vizinhos num bairro de periferia, tanto Tião, quanto Chico, nunca se deram ao desfrute de continuar os estudos.

Aos trinta anos continuavam a morar na casa dos pais.

Ambos nunca pensaram em se casar. Compromisso apenas com o ócio.

Era o tipo de gente que não tinha ambição. Para eles ficar dependurados na mesada que recebiam dos pais era o máximo com que sonhavam.

Depois do almoço, depois de um cochilo generoso, que se estendia até às quatro da tarde, pontualmente compareciam a um campinho de várzea, para animadas partidas de futebol.

Antes das seis já estavam ambos na mesa de um bar. A conta ficava no fiado. Lá pelas oito voltavam pra casa. Às dez da noite já estavam prontinhos a dormir. Um sono pesado. Próprio de quem nada tinha pra fazer.

Eis que o tempo passa a passos largos. Tanto Tião, quanto Chico, envelheceram.

Foi neste mês de novembro que os conheci. Foi naquele mesmo bar. Frequentado desde a mocidade.

Estava comodamente assentado a uma mesa do lado. Quando, de ouvidos atentos, escutei a prosa entre os dois.

Dizia Chico: “quer saber? Meu amigo. Trabalhar pra quê? Temos tudo que desejamos. Nunca nos faltou nada de nada. Daí o meu sossego. Temos nossos pais a quem escorar. Não importa até quando”.

Na resposta do outro amigo percebi certo ar de troça: “hoje estamos na casa dos sessenta. Em breve chega a aposentadoria. Pra quê procurar serviço”?

Foi quando Tião respondeu: “é a mais pura verdade verdadeira. Se estamos bem até nesta idade, pra que mudar? Já passamos do tempo de trabalhar. Agora só nos resta aposentar de vez”.

Saí daquele lugar pensando com meus botões: “quantos jovens pensam como eles. Eles fazem parte da geração Nem Nem. Nem trabalham nem estudam. E passam a vida inteira às costas dos pais.

Deixei o Tião Nem e o Chico Também naquela prosa insossa. Quem sou eu para recriminá-los? Como eles existem aos montes. Essa imensa legião de desocupados.

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