” Pra que morrer agora”?

Como se fosse possível prever ou vaticinar qual seria o dia e hora de morrer.

A morte acontece independentemente de nosso desejo.

Ela vem num lampejo. Num piscar de olhos ou devagarinho. Pode ser numa curva do caminho ou numa reta interminável. Por um acidente imprevisível ou por imprudência do motorista.

Não se pode contestar a veracidade da morte. Ela é uma das mais insofismáveis verdades. Não se pode fugir dela mesmo que nossa vontade implore. Se a morte tiver de acontecer um dia, que seja num dia como esse. Céu tinto em cinza. Frio e chuviscoso.  Durante o sono numa noite escura. Que eu não possa ver a lua ou o clarume piscante das estrelas.

Não desejo a morte pra ninguém. A não ser que a pessoa esteja em seus últimos dias. Inerme num leito de hospital. Agonizante sem ao menos poder abrir os olhos. Ou alçar as mãos na intenção de dizer, como não pode se fazer entender de outros modos. Por favor, alivie o meu sofrer. Deixe-me avoar a outra vida. Quem sabe lá encontre a felicidade. Já que aqui a tristeza foi minha única companheira. Nesses muitos anos que sobrevivi.

Se um dia a morte tiver de chegar. Que me permitam despedir da vida felicitando-a por ter sido tão bela. Naqueles momentos em que vivi ao lado dela. Tendo minha família com quem repartir a minha alegria.

Depois de morto não me importa o que falem de mim. Se disserem que fui bom que o digam enquanto eu for capaz de ouvir. Pois depois de sepulto não irei escutar encômios ou críticas a minha pessoa. Não me importa se morto estiver. Que se debulhem em lágrimas à beira do meu túmulo. Ou que depositem flores sobre meu jazigo. Pois elas murcham e eu não serei capaz de restituir-lhes a vida.

Uma vez dentro do meu caixão meus restos mortais não serão capazes de saber quem de fato gostava de mim. Se gostam digam enquanto eu ainda estiver vivo. Não me pranteiem com lágrimas de crocodilo engolindo a presa. Não chorem se não tiverem vontade. Não sintam pena de mim. Que o façam se de fato sentirem.

Pra que morrer agora? Já se fizeram essa pergunta?

Já manifestaram esse desejo em vida?

Eu por vezes faço. A resposta não a tenho na ponta da língua.

Por vezes penso e indago a mim mesmo.

Morrer nessa hora exata não me convém.

Quem sabe noutra hora e noutro dia. Depois de concluir mais um livro recheado de um monte de crônicas.

Morrer a seguir de uma vida repleta de boas novas também não me apraz. Quem sabe depois de noticias nada agradáveis consiga  morrer feliz?

Deixar de viver depois de uma chuvica mansinha da mesma maneira não me sentirei a vontade. E a seguir de uma tempestade por certo partirei infeliz.

Morrer numa hora incerta quem sabe seria de bom tom? Ai sim, morrerei sem saber quando.

Pra que morrer nessa hora? Se tem tantas horas pra deixar de viver?

Tenho um mundo inteiro ainda pra percorrer.  Minhas pernas são andarilhas. Minha mente hiperativa. Não me canso da vida. E não desejo descansar na morte.

Daí o meu desejo de continuar por aqui até que chegue o meu fim.

Num dia ainda não definido. Já que somos finitos pretendo encompridar minha finitude até quando não sei.

Dou um basta de falar em morte. Ponto final nesse texto. Não no meu fim.

 

 

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